Um país com linhas de produção de Gripen e Super Tucano não deveria recorrer a caças usados
Por Fernando “Nunão” De Martini
As recentes notícias sobre estudos da Força Aérea Brasileira para eventual aquisição de caças F-16 usados, confirmados em nota pela própria FAB, indicam uma mudança no planejamento de renovação da Aviação de Caça do Brasil. Uma mudança para pior, um retrocesso.
Um país com linhas de produção ativas de dois tipos de aviões de combate, uma delas a um ano de iniciar as entregas à FAB de 15 jatos supersônicos multifunção Saab Gripen E (de um total de 36 encomendados), e outra ainda produzindo turboélices de ataque leve Embraer Super Tucano, não deveria voltar a fazer compras de caças usados. Muito menos caças que não estão em seu inventário (diferentemente dos necessários recompletamentos com Mirage III e F-5) como foi a compra de aviões Mirage 2000 C/B, de curta vida na FAB, e como poderá ser a eventual aquisição de aeronaves F-16 disponíveis hoje no mercado de usados, com mais de 30 anos de operação.
O site Poder Aéreo, que acompanhou todo o desenrolar do programa F-X2 desde 2008 (data em que o site entrou no ar, mas seus editores já acompanhavam o tema desde o F-X, engavetado em 2003), não está alheio às dificuldades que o reequipamento da Aviação de Caça passou durante as últimas décadas.
Pelo contrário, aqui foram publicadas milhares de notícias sobre o tema, além de centenas de análises aprofundadas a respeito. Por isso mesmo, nos julgamos em posição de analisar com frieza a real capacidade de nossos esquadrões de combate, no momento, e os desafios dos próximos anos. E também propor, ao menos, uma alternativa à compra de caças usados para preencher uma lacuna que sim, sabemos que existe, e que tende a crescer com as desativações previstas de jatos A-1M ao final de 2025 e de caças F-5M ao final da década.
Obviamente não temos a pretensão de ensinar o “Pai-nosso ao vigário”. Quem tem todos os dados e prognósticos a respeito é a FAB. A intenção é fazer uma análise baseada em fatos disponíveis e indicar uma possível alternativa, envolvendo as próprias linhas de montagem instaladas no Brasil, mencionadas no título deste artigo. Primeiro, vamos aos fatos:
O reequipamento com o Gripen está demorado e sofre com atrasos. Seu cronograma original já foi esticado. Hoje, a poucos meses do aniversário de 10 anos da assinatura do contrato do Gripen E/F com a empresa sueca Saab, há apenas 8 caças Gripen voando no Brasil.
O cronograma, refeito algumas vezes sob justificativas orçamentárias e que, hoje, indica final de entregas para 2027 (tecnicamente possível, porém financeiramente desafiador na sua autorização de despesas anuais pela concentração de entregas nos dois anos finais), previa o recebimento de 4 aeronaves em 2023.
Porém, vieram apenas 3 caças ao longo do ano passado. E lá se vão seis meses desde o último desembarque de um Gripen no Brasil, em 11 de dezembro do ano passado. A aeronave não entregue em 2023 ainda não chegou, muito menos a primeira das 3 programadas para este ano. Veja o cronograma abaixo:
Dos oito caças voando no país, a FAB opera sete deles em um único esquadrão de caça, o 1º GDA, Esquadrão Jaguar, da Base Aérea de Anápolis, com as matrículas 4101 a 4107. O outro caça em voo é o primeiro exemplar a chegar ao país (4100), e que ainda está vinculado ao GFCT – Gripen Flight Test Centre / Centro de Testes de Voo do Gripen – em Gavião Peixoto / SP.
Pois é justamente em Gavião Peixoto, complexo industrial da Embraer que abriga tanto as linhas de montagem estrutural e final do Gripen quanto do Super Tucano, que o Brasil deve investir na solução para seu reequipamento, e não em aviões usados.
Essa posição será explicada logo mais, após uma breve apresentação da situação atual, decorrente de mudanças e desativações de aeronaves e esquadrões de primeira linha nas últimas décadas.
Do relativo auge da primeira linha ao demorado reequipamento
Atualmente o 1º GDA voa intensamente seus 7 caças Gripen E, tanto para adestrar mais pilotos quanto para aprimorar suas capacidades em combate BVR (além do horizonte, com uso de mísseis de longo alcance) para o Exercício Cruzex de novembro deste ano. Ainda é um punhado de aviões, mas pelo ritmo a lógica diz que a aeronave deverá atingir sua IOC (Certificação de Operação Inicial) mais ou menos na época do exercício, com a certificação por enquanto focada na função ar-ar.
Ainda pela lógica, e se não houver atrasos, é provável que os treinamentos e testes de voo nas arenas ar-solo e de reconhecimento tático / Rec Tat para a futura FOC (Certificação de Operação Final) possam começar em 2025/2026. Ou seja, mais ou menos na época em que serão desativados os jatos A-1M da FAB, sob a justificativa de que não há mais sobressalentes disponíveis para seus motores.
Mas quantos são os jatos A-1M da FAB, atualmente? Pouco mais do que os caças Gripen voando hoje, um punhado.
São menos de 10 aeronaves operando atualmente na Base Aérea de Santa Maria, e esse reduzido número, ainda por cima, é compartilhado por dois esquadrões: o 1º/10º GAV, Esquadrão Poker, focado principalmente em missões de Rec Tat, e o 3º/10º GAV, Esquadrão Centauro, mais voltado às missões de Ataque (grosso modo, arena ar-solo). Foi-se o tempo em que o A-1 compunha praticamente metade da primeira linha, com cerca de 50 aviões em operação.
Esse número foi atingido na virada dos anos 1990/2000, quando a primeira linha da Aviação de Caça da FAB era formada por pouco mais de 100 jatos Mirage III, F-5 e A-1 divididos em 6 esquadrões: 1º GDA (Mirage) em Anápolis-GO, 1º GAVCA (F-5) em Santa Cruz-RJ (formado pelos esquadrões Jambock e Pif-Paf, mas que funcionavam como uma única unidade e com dotação de pilotos e aeronaves equivalente a um esquadrão), 1º/16º GAV (A-1) também em Santa Cruz, 1º/14º GAV (F-5) em Canoas-RS, e os já mencionados 1º/10º GAV e 3º/10º GAV (A-1) em Santa Maria-RS.
De lá para cá, outro esquadrão evoluiu para a primeira linha, o Pacau (1º/4º GAV), trocando seus jatos AT-26 Xavante por caças F-5M e mudando de Natal para Manaus. Mas sua dotação era de meia dúzia de aviões. Com todo o respeito às tradições do esquadrão, podemos dizer que teria o mesmo efeito um esquema de rodízio de seções de caças F-5M, de outros esquadrões, para o alerta em Manaus.
Também nesse meio-tempo, na primeira linha, houve a modernização de quase 50 caças F-5 e de menos de uma dúzia de jatos A-1. Também houve a entrada e saída de operação do Mirage 2000 no 1º GDA (com o F-5M preenchendo a lacuna até a chegada do Gripen), e a desativação do próprio Pacau em 2021, além do 1º/16º GAV, Esquadrão Adelphi, em 2016.
Em suma, nos últimos 25 anos a primeira linha da Aviação de Caça cresceu de 6 para 7 esquadrões, voltando alguns anos depois para 6 e, mais recentemente, reduzindo para 5. Quanto aos seus jatos, a frota foi reduzida de cerca de 100 aviões para pouco menos de 50 nos dias de hoje.
Mas não se deve esquecer que no seu auge, por volta do ano 2000, a primeira linha tinha três dos então seis esquadrões voando caças já ultrapassados, equipados com Mirage III e F-5 (estes ainda não modernizados) representando cerca de metade da frota.
Os quase 50 caças e jatos de ataque que hoje equipam os esquadrões, sendo 7 Gripen e aproximadamente 30 F-5M e 10 A-1M, estão ao menos no estado da arte, no caso do Gripen. Já no caso dos F-5 e A-1 modernizados, estes incorporam capacidades razoavelmente atualizadas de sistemas digitais e armamento inteligente ar-ar e ar-solo.
De fato, é pouco. E também é fato que mesmo essa reduzida frota deverá diminuir com as baixas do A-1M no final do ano que vem e do F-5M até o fim da década, sendo substituída, na falta de novos contratos, por apenas 36 caças Gripen atualmente contratados.
Organizando as prioridades sem blefar com caças usados: Poker é a resposta
Como resolver essa questão? Caças usados parecem ser a solução mais prática e rápida disponível, e já foi utilizada no passado. Mas temos a opinião, expressa na chamada deste artigo, de que um país com linhas de produção de Gripen e Super Tucano não deveria recorrer a caças usados. Vamos defender esse ponto agora.
A prioridade é não perder as capacidades do A-1M, com baixa prevista para o final de 2025, nos dois esquadrões que detém hoje as funções de Rec Tat e de emprego ar-solo de bombas guiadas da FAB (incluindo missões de caráter estratégico de longo alcance e missões táticas com penetração a baixa altitude), com uso de pods de reconhecimento e de designação de alvos.
Afinal, mesmo reduzidos em número, esses aviões são fundamentais em capacidade (pois hoje só eles cumprem essas missões). Existe a evidente perspectiva da Força Aérea deixar de cumprir essas missões daqui a um ano e meio, num momento em que o Gripen ainda não atingirá sua FOC, ainda que se possa repassar essas capacidades ao F-5M com a integração de pods e bombas, porém com limitações de alcance e carga. Isso significaria uma lacuna na Defesa, e mesmo que esta capacidade se restrinja a um punhado de aeronaves compartilhadas por dois esquadrões, haveria perda de doutrina e de capacitação de oficiais aviadores, o que é inaceitável.
A lacuna em capacidade de ataque com bombas inteligentes e Rec Tat, utilizando aviões a jato, provavelmente será inevitável por um ano ou dois, a não ser que se adquira caças usados com entregas começando já no ano que vem. Mas há uma alternativa, e o problema pode ser em parte mitigado com a integração de bombas inteligentes ao A-29 Super Tucano, como veremos daqui a pouco, embora não seja a solução ótima (o ótimo, porém, é inimigo do bom).
A questão principal é evitar, primeiramente, a perda da capacidade humana, da experiência e doutrina dos pilotos de A-1M do 1º/10º GAV e do 3º/10º GAV. Para isso, propomos uma mudança de planejamento.
Em março deste ano, noticiamos os planos da FAB para reativar o Esquadrão Pacau em Anápolis, que seria a segunda unidade de Gripen na base. Seja para reassumir a função que teve por muitos anos, de “Sorbonne da Caça”, neste caso com missão de fazer a conversão operacional usando os caças Gripen F (entregas a partir do ano que vem), seja para iniciar a doutrina de emprego ar-solo no Gripen, acreditamos que este não é o momento de reativar o Pacau. O momento é de realocar o Poker para Anápolis, e que este seja o segundo esquadrão a iniciar reequipamento com o Gripen, nesta fase em que se pretende otimizar custos concentrando boa parte dos caças em recebimento na base goiana.
Sugerimos que os pilotos e pessoal de apoio do Esquadrão Poker sejam deslocados para Anápolis logo em seguida à desativação do A-1M no final de 2025, incorporando alguns pilotos do Esquadrão Centauro à sua dotação de malas prontas para a nova base. Assim, haverá tanto pilotos com experiência em Rec Tat quanto no emprego de bombas guiadas nesta mudança de base.
Parte desse grupo poderá iniciar treinamento em Gripen C/D na Suécia já em meados de 2025 (antes da desativação total do A-1M), convertendo depois para Gripen E em Anápolis. É provável que a introdução do Gripen F na conversão operacional ainda não estará plenamente estabelecida para treinar tantos pilotos de uma só vez (além do reduzido número de entregas de Gripen F em 2025) por isso o processo deverá ser gradual. Em seguida, esse grupo iniciará a doutrina da FAB para Rec Tat e de emprego ar-solo no Gripen, por volta de 2026/27.
Mas… e o Esquadrão Centauro?
Essa unidade permaneceria em Santa Maria, porém convertendo para uma nova versão do A-29, a ser denominada A-29M. Propomos, ao invés de gastar dinheiro adquirindo caças F-16 ou de qualquer outro tipo, usados, que se invista na aquisição de pelo menos 12 turboélices de ataque leve A-29 novos, em configuração mais moderna que a dos exemplares já em serviço em quatro esquadrões da FAB. Mesmo porque há um estudo em andamento para modernização de 68 aviões A-29 da frota atual, e todos poderiam receber o mesmo padrão: painel atualizado, similar ao do Gripen, além de capacidade de utilizar pods designadores, bombas inteligentes e outras capacidades atuais, seja de treinamento, seja de emprego operacional, como equipamentos RWR, dispensadores de chaff, flares etc.
Ao invés de 24 caças F-16 usados (quantidade aventada em publicação recente) com 30 anos de serviço nas costas e relativamente pouco tempo pela frente, nossa sugestão é adquirir um avião fabricado no Brasil e com capacidade de servir à nossa Defesa por muitas décadas.
Ainda que não tenham a mesma capacidade de jatos, essa dúzia de aviões A-29M, incorporados ao Esquadrão Centauro, permitiriam manter sem perda de tempo a doutrina de emprego de armas ar-solo inteligentes, ampliar esse conhecimento e disseminá-lo aos outros esquadrões operadores da aeronave, na fila para terem seus aviões modernizados para o mesmo padrão. A lacuna operacional seria reduzida.
Isso representaria uma ampliação das capacidades atuais da FAB, mesmo não sendo em esquadrões da chamada primeira linha. Um investimento melhor e com possibilidade de gerar benefícios para mais unidades da FAB do que a compra de duas dúzias de caças usados. E, provavelmente, por metade do valor.
Recentemente foi noticiado que a Força Aérea Argentina vai adquirir 24 caças F-16 usados por cerca de 650 milhões de dólares, num pacote que inclui armamentos, treinamentos e serviços. Há poucos anos, a Nigéria adquiriu um pacote de 12 Super Tucanos novos por cerca de 340 milhões de dólares.
Ainda que suponhamos uma aquisição brasileira de F-16 por menos do que a Argentina vai pagar (pela possibilidade de aproveitar parte do armamento existente na FAB, por exemplo), o mesmo valeria para uma aquisição de 12 Super Tucanos, pelo fato do pacote nigeriano incluir diversos serviços de implantação e treinamento que a FAB não precisaria contratar.
Em suma, o valor de uma compra de 12 Super Tucanos modernos equivaleria a metade do custo de 24 caças F-16 usados (não estamos aqui comparando a enorme diferença de desempenho de ambos, e sim a adequação às necessidades da FAB).
A diferença entre o que se gastaria para comprar e armar os F-16 poderia ser empregada na compra de mais bombas guiadas e outros armamentos modernos, não só para os A-29M que propomos para o Esquadrão Centauro, mas para os três esquadrões do 3º Grupo de Aviação baseados em Boa Vista, Porto Velho e Campo Grande. De quebra, esse investimento em aeronaves seria feito no Brasil, mantendo ativa uma linha que atualmente produz poucos aviões por ano para clientes externos, como visto em matéria recente aqui no Poder Aéreo.
A linha está aberta, funcionando. Quem sabe, uma encomenda feita agora significaria algumas aeronaves entregues já em 2026. Ainda que não se encomende nenhum A-29 novo por falta de orçamento, a sugestão é que, pelo menos, seja contratada rapidamente a modernização da frota existente (este sim um investimento ainda mais importante) e se redistribua em seguida as aeronaves da frota, para que uma parte sirva para reequipar o Esquadrão Centauro e seja entregue com mais urgência. Os Super Tucanos da FAB deverão ser modernizados, conforme já revelado por executivo da Embraer, nas próprias instalações onde hoje está a linha de montagem da aeronave.
Mas o A-29M não substitui o A-1M!
Você provavelmente pensou nisso ao ler os últimos parágrafos. Sim, o A-29M não substitui o A-1M, tal qual um caça F-16 usado substituiria, pois um A-29M não tem o desempenho de um jato, capacidade de sobrevivência e carga de armamento. A aeronave que substitui o A-1M se chama Gripen.
Como visto mais acima, transferindo o Esquadrão Poker (ao invés de reativar o Pacau) para Anápolis no início de 2026, será iniciado o treinamento de seus pilotos no Gripen e seu reequipamento gradativo.
Quando a quantidade de caças entregues chegar a 24 exemplares, haverá dois esquadrões reequipados com Gripen em Anápolis: o Jaguar, mais dedicado a missões de defesa aérea, e o Poker, mais voltado a missões ar-solo (incluindo o uso de bombas guiadas) e de reconhecimento tático. Ou seja, teremos a doutrina mantida e as capacidades ar-solo e Rec Tat ampliadas em relação ao que é oferecido, hoje, por cerca de 10 de A-1M compartilhados por dois esquadrões.
Haveria uma lacuna operacional de poucos anos nessas arenas (mas não haveria perda da doutrina), em parte compensada pela capacidade, introduzida nesse meio-tempo, do futuro A-29M em missões ar-solo com armas inteligentes.
Só que 36 caças Gripen não bastam
De fato, essa quantidade está longe de bastar para o reequipamento dos 5 esquadrões de primeira linha atuais, e mesmo que um deles (o Centauro) seja reequipado com o A-29M, haveria outros 4 a reequipar, lembrando que o F-5M deverá dar baixa no fim desta década.
O ideal seria que o F-5M permanecesse mais alguns anos no Pampa ou no Jambock / Pif Paf (a depender da oferta de sobressalentes no mercado) permitindo tempo adicional para receber mais caças Gripen, que poderão ser adquiridos por um aditivo, em negociação, de 25% no valor do contrato de 36 caças, chegando a aproximadamente 50 aeronaves, e / ou por um novo contrato. A intenção da FAB, ajustada há cerca de 2 anos, é ter uma frota de pelo menos 66 caças Gripen. Se a Força está estudando a aquisição de caças usados, é porque provavelmente vê esse planejamento ameaçado por questões orçamentárias.
Caças usados podem compensar isso? Podem, mas são um tiro no pé, pois se questões orçamentárias ameaçam a continuidade da aquisição de caças Gripen, a compra de caças usados piora ainda mais o problema orçamentário.
A lógica é simples: o dinheiro para comprar os caças usados, a rigor, não existe. Será necessário financiar a aquisição de eventuais 24 caças F-16 de segunda mão. Suponhamos, numa hipótese muito otimista, que se consiga uma excelente negociação e a compra seja feita por um valor menor que o estimado para a Argentina, que deverá pagar 650 milhões de dólares por seus 24 aviões e armas.
Digamos que, economizando aqui e ali no pacote, dado que parte do armamento atual da FAB é compatível com o F-16, o Brasil gaste 500 milhões de dólares nessa aquisição de caças, com serviços, sobressalentes, treinamento e parte do armamento inclusos.
Esse valor viria de onde? Provavelmente viria do comprometimento da capacidade de financiar novas compras de caças Gripen, pois não é um valor disponível hoje, é um novo financiamento que precisaria ser contratado. E, mesmo que o dinheiro estivesse disponível, não seria melhor empregado em caças novos, mesmo que em menor número, com 30 ou até 40 anos de serviço pela frente?
Cada dólar gasto em caças usados é um dólar a menos para investir em caças novos
E também é um dólar (ou real) a menos para investir em outro avião com linha de montagem à disposição aqui no Brasil, o Super Tucano. É um dólar gasto fora do país, sem qualquer retorno econômico. É gasto, não é investimento. A hipótese otimista, aqui dada como exemplo, de se gastar 500 milhões de dólares em 24 caças usados, representa metade do que possivelmente se investirá num aditivo de 25% do contrato atual do Gripen.
Grosso modo, os 39 bilhões de coroas suecas do contrato atual de 36 aviões equivalem (somando a compra de armamentos) a 4 bilhões de dólares, ou pouco mais, ao câmbio de hoje. Um aditivo de 25% ao contrato, que acrescentaria 12 a 15 aeronaves (conforme já revelou o próprio CEO da Saab recentemente) somaria cerca de US$ 1 bilhão a ser financiado.
Ou seja, a compra de caças usados já comprometeria metade do que o país pretende investir num aditivo ao contrato do Gripen.
Com esse aditivo, que ampliaria a quantidade de caças Gripen para cerca de 50 aviões, seria possível reequipar com caças novos todos os 4 esquadrões de primeira linha (restantes após reequipar o Centauro com A-29M) com o mínimo necessário de 12 aviões cada. Se o aditivo for negociado ainda neste ano, é plausível que as entregas de 12 a 15 aviões sejam iniciadas a tempo de se seguirem às do contrato atual, cujas entregas vão até 2027.
Digamos que esse cronograma atual não se cumpra e que os últimos dos 36 caças atualmente contratados se atrasem por dois anos, chegando só em 2029. Ainda assim, as primeiras entregas do aditivo chegariam a tempo de iniciar o reequipamento do último esquadrão a voar F-5M, que desativaria suas aeronaves também por volta de 2029.
Caso a situação orçamentária melhore ao final desta década, um segundo lote poderia ser contratado, aumentando a dotação de aeronaves por esquadrão ou mesmo permitindo reativar o Pacau em meados dos anos de 2030.
Resumo da sugestão apresentada aqui, numa única e longa frase: ao invés de gastar pelo menos meio bilhão de dólares (provavelmente mais) em caças com 30 anos de serviço e com previsão de pouco mais de uma década de operação, compra esta com grande chance de comprometer a capacidade atual de investir em caças novos, que se planeje o mitigamento de riscos de perda de capacidade e doutrina com aviões atualmente em produção aqui no país.
Pela prioridade dada com a baixa próxima do A-1M, que se reequipe o Esquadrão Centauro com A-29 / A-29M em Santa Maria e que o próximo esquadrão a receber caças Gripen seja o Poker, mudando a unidade para Anápolis para otimizar os dispêndios neste momento.
Todos os dólares que se pense em gastar com caças usados serão muito melhor empregados em ampliar o contrato atual, permitindo reequipar minimamente os esquadrões de Santa Cruz e Canoas na virada dos anos 2020-30. Não é demais repetir: um país com linhas de produção de Gripen e Super Tucano não deveria recorrer a caças usados.