Saab Gripen E com o casulo EAJP no pilone mais externo

Sérgio Santana*

Recentemente foi anunciado aqui no Poder Aéreo que a Força Aérea da Alemanha, a Luftwaffe, selecionou a suíte modular de guerra eletrônica Saab Arexis para equipar 15 exemplares dos seus caças Eurofighter.

Para o JAS-39 Gripen E/F existe uma variante específica do Arexis, chamada “Multi-Function System-Electronic Warfare” ou MFS-EW, Sistema Multifuncional – Guerra Eletrônica.

As origens do MFS-EW

O MFS-EW é uma evolução exponencial do EWS-39, o conjunto de guerra eletrônica instalado nas versões anteriores do Gripen.

Sistema de guerra eletrônica do Saab JAS 39C/D Gripen

O MFS-EW foi desenvolvido para deixar o Gripen mais preparado para enfrentar as mais poderosas ameaças atuais e também aquelas que podem surgir nas próximas décadas, levando em consideração não apenas a possibilidade da aeronave fazer parte de coalizões internacionais (como demonstrado em 2011 quando a Real Força Aérea Sueca deslocou cinco de seus JAS-39C Gripens para a Base Aérea de Sigonella na Sicília, como parte das operações lideradas pela OTAN Odyssey Dawn/Unified Protector organizadas para proteger o povo líbio das forças leais ao então ditador daquele país Coronel Muammar Gaddafi).

Também influiu o aperfeiçoamento das forças de defesa aérea russas baseadas no enclave russo de Kaliningrado, situado a pouco mais de 500 km de Estocolmo. Tal reforço, na forma de uma bateria de mísseis terra-ar de alta altitude/longo alcance Almaz-Antey S-400, foi anunciado pelo Ministério da Defesa da Federação Russa em março de 2019. Também conhecido como SA-21 “Growler”, seu radar de vigilância aérea terrestre 92N6E tem um alcance instrumentado de 400 km, tornando-o capaz de cobrir a maior parte daquela distância. Outra razão para acelerar os esforços de operacionalidade do MFS-EW foi a introdução do Sukhoi Su-57 “Felon” no inventário da Força Aeroespacial da Federação Russa, o que ocorreria pouco tempo depois.

O fator final que levou ao desenvolvimento do MFS-EW foi que ficou claro que o primeiro desenvolvimento do EWS-39 planejado para equipar o Gripen E/F não foi suficiente para convencer os clientes estrangeiros a selecionar a aeronave em comparação com outras.

O MFS-EW em detalhes e suas vantagens operacionais

O MFS-EW é composto de vários sistemas, espalhados pelas fuselagens superior e inferior do Gripen. Instalados na superfície superior estão três MAWSUs (Missile Approach Warning Sensor Unit, Unidades do Sensor de Alerta de Aproximação de Míssil, do modelo Elisra PAWS-2); uma EWCU (Electronic Warfare Central Unit, Unidade Central de Guerra Eletrônica); duas PPU (Primary Power Units, Unidades de Potência Primária); um NGIR (New Generation Infrared Missile Approach Warning Processor, Processador de Nova Geração de Alerta de Aproximação de Míssil Infravermelho); um TFA (Transmitter Forward/Aft, Transmissor Dianteiro/Traseiro, instalado nas seções dianteira e traseira do estabilizador vertical, atuando em banda baixa, para realizar interferência contra sensores adversários localizados nos hemisférios frontal e traseiro, respectivamente); três dispensadores Chaff/Flare BOP-G, instalados na fuselagem traseira; e, por fim, duas RPSs (Receiver and Power Supply units, Unidades de Receptor e Fonte de Alimentação) e quatro QRTs (Quadrant Receiver and Transmitter units, Unidades Receptoras e Transmissoras do Quadrante), em bandas médias, instalados nos trilhos das pontas das asas do Gripen, para executar a interferência contra sensores adversários localizados em ambos os lados. Os Dispensadores de Chaff/Flare BOP-G podem ejetar várias contramedidas, desde os chamarizes ativos BriteCloud até os chaffs BOL Mk 2 Tipo 1, bem como os flares BOL-IR MJU-52/B e L5A2.

Destes, os MAWSUs, como o próprio nome indica, detectam mísseis direcionados por radar próprio ou da aeronave/plataforma lançadora que se aproximam, enquanto os NGIRs fazem o mesmo com mísseis de busca de calor. Por sua vez, a fuselagem inferior da aeronave abriga outras três MAWSUs; duas Unidades de Interface; uma VLBA (Very Low Band Antenna, Antena de Banda Muito Baixa); dois dispensadores BOL 739/3 Chaff/Flare, instalados na seção traseira dos pilones de armas internos sob as asas e dois dispensadores BOL 739/2 Chaff/Flare, montados na seção traseira dos pilones externos de armas sob as asas. Todos os sistemas acima são gerenciados pela EWCU e alimentados pelas Unidades de Energia Primárias.

Gripen E – EW – Quadrant receiver and transmitter
Gripen E – EW – Missile approach warner

Além destes detalhes, o novo sistema possui Módulos Transmissores/Receptores baseados em Nitreto de Gálio, já implementados no radar Erieye-ER AEW&C, o que melhora o desempenho geral (incluindo o relacionado à consciência situacional) se o Gripen E/F for ser operado junto com aeronaves equipadas com Erieye-ER, já que o nível de fusão de sensores do primeiro será maior do que é hoje, graças à sinergia entre o MFS-EW e o radar Raven ES-05 AESA.

O sistema DRFM do Arexis do Gripen E/F gera alvos falsos nos radares do inimigo

O MFS-EW foi projetado com uma arquitetura AESA, o que significa que pode enfrentar várias ameaças ao mesmo tempo, como vigilância terrestre ou radares de controle de disparo, com um nível de precisão sem precedentes em relação à geolocalização, que pode ser tão baixo quanto 0,1º num raio de 360º. Não é confirmado pelo fabricante mas espera-se que o conjunto de guerra eletrônica do Gripen E/F cubra uma faixa de onda entre 0,5 GHz e 40 GHz, o que o torna capaz de detectar a orientação de armas e radares terrestres projetados para encontrar aeronaves furtivas.

Finalmente, pela primeira vez em uma aeronave, o MFS-EW combina também as funcionalidades do RWR (Radar Warning Receiver, Receptor de Alerta Radar) e das ESM (Electronic Support Measures, Medidas Eletrônicas de Apoio), de forma que possa identificar e geolocalizar uma determinada ameaça, acionar a medida adequada para combatê-la e realizar tarefas de inteligência eletrônica, ao mesmo tempo que armazena o sinal a ser analisado posteriormente. Tudo simultaneamente e em segundos.

O EAJP

Jammer Pod Arexis

Tanto o Arexis quanto o MFS-EW podem ter seu poder aumentado com o EAJP (Electronic Attack Jamming Pod, Casulo de Interferência de Ataque Eletrônico), revelado pela primeira vez no DSEI 2017, como sendo a parte mais visível dos sistemas.

Em 4 de novembro de 2019 o Saab JAS-39D Gripen “39822” voado pela ala F 21 “Norrbottens Flygflottilj” da Real Força Aérea sueca, decolou de Luleå. O objetivo do voo, posteriormente chamado de “bem-sucedido” e o primeiro com o EAJP, foi avaliar a integração e o comportamento do equipamento com os sistemas embarcados no caça.

Contudo, tanto o potencial ofensivo do MFS-EW quanto do EAJP só poderão ser usufruídos totalmente pelos Gripen E/F a partir de 2026, quando se espera que todos os exemplares fabricados a partir de 2021 já tenham seu radar qualificado para emprego pleno, assim envoluindo, através da instalação de kits de atualização, da configuração MS21/M1, que caracteriza tais exemplares, para a configuração MS22/N1, que possibilita ações ofensivas com o MFS-EW/EAJP, e só virá instalada nos exemplares fabricados a partir de 2022. Com a MS21/M1, o MFS-EW só pode atuar em modo passivo, usando as capacidades de RWR e ESM.

O Arexis/MFS-EW e um novo míssil radiação?

Gripen E com SPEAR-EW (LADM)

É comum (e até esperado) que aeronaves de guerra eletrônica portem armamento especializado para a sua missão.

Assim, em agosto de 2020 durante o Kauhava Air Show, na Finlândia, a Saab anunciou o LADM (Lightweight Air-lanced Decoy Missile, Míssil Isca Aerolançado Leve), uma arma ainda em desenvolvimento com a Finlândia, e oferecida para a competição HX do país, que pretendia selecionar até 64 exemplares de um caça de última geração para equipar a Força Aérea Finlandesa e acabou sendo vencida pelo Lockheed Martin F-35 Lightning II.

Trabalhando em conjunto com o sistema EAJP/Arexis, o LADM foi projetado para fornecer interferência e gerar alvos falsos para radares de defesa inimigos (como aqueles dedicados a adquirir/rastrear alvos e direcionar armas contra eles) enquanto os Gripens podem atingir seus objetivos designados.

Entretanto, com a recente entrada da Finlândia na OTAN e do provável movimento da Suécia no mesmo sentido em breve, com as consequentes maiores ofertas a vários sistemas de armas o futuro do LADM parece incerto, embora estas adesões à Aliança Ocidental também possam impulsioná-lo.


* Sérgio Santana é Bacharel em Ciências Aeronáuticas (Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL), pós-graduado em Engenharia de Manutenção Aeronáutica (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC/MG). Colaborador de Conteúdo da Shephard Media. Colaborador das publicações Air Forces Monthly, Combat Aircraft e Aviation News. Autor e co-autor de livros sobre aeronaves de Vigilância/Reconhecimento/Inteligência, navios militares, helicópteros de combate e operações aéreas.

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