Inauguração da linha de montagem do Gripen no Brasil: o que ainda não contaram para você (parte 3)
Por Guilherme Poggio
O processo industrial da montagem final do Gripen, descrito na partes anteriores desta matéria, que podem ser lidas nestes links (parte 1 e parte 2) teve como base as informações fornecidas pelo engenheiro da Saab responsável pela linha em Linköping, quando da nossa visita às instalações em 2019.
Tudo indica que o processo será replicado no Brasil, obedecendo aos mais rigorosos processos de segurança. É importante lembrar que a Saab nunca teve uma linha de montagem dos seus caças fora da Suécia em toda a sua história. E veja que a empresa projeta e constrói aeronaves militares desde a década de 1930.
Portanto, a instalação de uma linha de montagem do Gripen na Embraer é tão importante para o Brasil como é para a Saab. No passado, a empresa sueca negociou a produção de componentes do Gripen em outros países, como foi o caso da África do Sul (um dos usuários do Gripen C/D), mas a instalação de uma linha de montagem fora da Suécia, para caças, é inédita.
O Brasil não é exatamente um “marinheiro de primeira viagem” nessa jornada aeronáutica. A Embraer é uma das maiores empresas desse ramo no planeta e seus produtos voam nos cinco continentes. Seus projetos competem nos mercados mais exigentes do mundo e a tecnologia embarcada nas aeronaves não deixa nada a desejar para os concorrentes. Se a Saab procurava um parceiro com capacidade para absorver uma segunda linha de montagem final do Gripen, a escolha não poderia ser mais feliz.
Mesmo com todo esse know-how, a Embraer não é e nunca foi fabricante de aeronaves militares de alto desempenho. Na década de 1970 ela produziu sob licença o jato de treinamento EMB-326, aqui rebatizado de “Xavante” e na década seguinte veio a produção conjunta do jato de ataque subsônico AMX. Desde então a empresa nacional não “ultrapassou a barreira do som”, embora tenha desenvolvido em parceria com outras empresas o programa de modernização do caça F-5 da FAB.
Pelo que apurei no local, a linha já instalada na Embraer contará com dois processos: a montagem estrutural e a montagem final. Conforme visto anteriormente, no processo realizado na linha sueca a montagem estrutural compreende a união das grandes partes da futura aeronave para gerar uma única célula. Na Embraer já existe uma célula que passou por essa etapa.
Portanto, esta mesma célula (cujo C/N – construction number – não foi fornecido) estaria pronta para iniciar os trabalhos de montagem final (ver imagem abaixo). E, seguindo a forma de trabalho empregada na Suécia, esta mesma célula já estaria na Estação 1 para receber os cerca de 17.000 itens programados.
Como a planta já possui duas bancadas distintas, ela pode montar duas aeronaves ao mesmo tempo que estejam passando pela etapa da Seção 1. É importante relembrar que esta é uma complexa e demorada fase onde muitos itens são incorporados à célula. Nas etapas seguintes (sempre levando em consideração o processo feito na Suécia) as células não necessitam mais do apoio das bancadas e podem liberar as mesmas para as próximas células que entrarão na linha de produção.
O espaço físico que existe à frente das bancadas, local onde ocorreu a cerimônia de inauguração da linha de montagem (polígono verde destacado na imagem abaixo), muito provavelmente será ocupado pelas estações 2 e 3 num futuro próximo.
Não precisa ser um gênio da engenharia aeroespacial para notar que o espaço é bastante amplo e possui muita folga para a montagem final das aeronaves. E exatamente pela amplitude da área é possível dizer que a estrutura atualmente instalada pode ser duplicada. O espaço ao lado das duas bancadas existentes (indicadas por um triângulo azul na imagem acima), atualmente um largo e espaçoso corredor (polígono vermelho) por onde tivemos acesso ao hangar, pode provavelmente receber mais outras duas bancadas, caso seja necessário. E ainda sim sobraria mais da metade da área para a instalação das estações 2 e 3 de montagem.
Quanto às etapas pós-montagem final, em princípio não seriam necessárias grandes mudanças. A planta já possui instalações para a pintura de aeronaves, local apropriado para a instalação de assento ejetor (lembrar que a linha de montagem final do Super Tucano – aeronave que também possui assento ejetor – fica ao lado da linha do Gripen e dentro do mesmo hangar) e bancada para testes de motor.
Para a etapa final, os testes de voo e aceitação, no ano de 2020 a Embraer e a Saab, inauguraram o Centro de Ensaios em Voo do Gripen (GFTC, do inglês Gripen Flight Test Centre), também em Gavião Peixoto. Ou seja, as aeronaves em produção no Brasil poderão contar com o seu ciclo final de fabricação totalmente feito no país antes da entrega para o cliente. Lembrando que existem também etapas do ciclo inicial da fabricação, caso de partes da célula que são enviadas às linhas da Embraer no Brasil e da Saab na Suécia (como fuselagem dianteira, traseira, caixões das asas, entre outros componentes) que são feitas no país, nas instalações da SAM (Saab Aeronáutica Montagens) em São Bernardo do Campo, SP.
Atualmente estão contratadas a montagem final de 15 exemplares do modelo monoposto pela Embraer. Todas estas aeronaves são do primeiro lote. Espera-se que um segundo lote seja firmado em breve e que a Embraer possa construir mais unidades, afinal a planta possui uma boa capacidade de produção e provavelmente, como vimos, de expansão.
Clique nos links para acessar a parte 2 e a parte 3 desta matéria.