O cubano que, com um MiG-23, foi o único piloto latino-americano a abater um caça Mirage
Por JAKOB OREKHOV
Incidente ocorreu em um combate travado em 1987, durante a guerra de Angola
Entre 9 de setembro e 7 de outubro de 1987, as Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA), na tentativa de subjugar o movimento insurgente angolano UNITA no sudeste do país africana, foram decisivamente repelidas em uma série de combates no rio Lomba graças à intervenção da SADF (Força de Defesa da África do Sul).
Com as FAPLA em recuo para o ponto de partida da sua ofensiva, no Cuito Cuanavale (município no sudeste de Angola, na região fronteiriça com a Namíbia e Zâmbia), a SADF e a UNITA lançaram um ataque e, assim, começou o cerco com bombardeios de artilharia de longo alcance em 14 de outubro. Diante da possibilidade de derrota, Angola recorreu a Cuba.
MiG vs Mirage
Em 27 de setembro de 1987, dois MiG-23MLs cubanos, comandados pelo major Alberto Ley Rivas, decolaram para realizar uma missão de resgate de helicópteros na área de Cuito Cuanavale, quando receberam um alerta do radar terrestre: havia dois caças sul-africanos penetrando o espaço aéreo angolano e rumo ao norte.
Os MiG-23MLs seguiram então as indicações do radar com o objetivo de interceptar os Mirages, aproximando-se de frente. Tratava-se de dois Mirage F1CZ do 3º Esquadrão SAAF, pilotados pelo comandante Carlo Gaggiano e pelo capitão Arthur Piercy.
O radar do MiG-23ML cubano mirou o primeiro Mirage F1 a 12 km, mas não foi capaz de disparar seu míssil R-24 de médio alcance. Os caças se viraram e, de sua posição, o MiG-23ML do colega cubano permaneceu na frente – este levava apenas mísseis de curto alcance R-60MK (AA-8 Aphid, na denominação da Otan).
As duas duplas de caças se cruzaram de frente e viraram horizontalmente tentando se posicionar na cauda do inimigo. Os MiG-23MLs eram mais manobráveis e conseguiram se posicionar na cola das aeronaves francesas. Ao fazer o disparo, um R-60MK explodiu na cauda de um dos Mirages. O outro Mirage, ao ver o destino de seu companheiro, mergulhou em direção ao solo, e deixou o combate em voo baixo em direção à Namíbia.
Os MiG-23MLs tentaram perseguir o segundo avião, mas já estavam no limite de combustível e acabaram voltando para a base. O major Alberto Ley Rivas, de 32 anos e que completava sua terceira campanha em Angola naquele ano, pousou feliz comemorando a vitória.
Arthur Piercy conseguiu deixar o combate, porém danificado, mergulhou no solo para escapar e seguiu a toda velocidade para o campo de pouso em Rundu, na Namíbia. O míssil R-60MK havia explodido perto do nariz, danificando também as asas e os lemes.
O freio aerodinâmico havia desprendido, mas o pior é que o sistema hidráulico tinha sido seriamente atingido e começou a falhar. Piercy mal podia controlar seu Mirage F1CZ e, ao tentar pousar, saiu da pista, colidindo e perdendo o trem de pouso. Com o impacto, o assento ejetável disparou, mas o paraquedas de Piercy não teve tempo de abrir e ele se chocou contra o solo. Como resultado, o capitão machucou seriamente a coluna e ficou inválido.
Durante anos, a África do Sul escondeu a derrota em combate deste Mirage, qualificando-a como acidente, embora hoje reconheça que a causa foi o embate com Rivas.
Dos outros enfrentamentos travados entre os aviões cubanos e os sul-africanos, as informações são vagas de ambos os lados. A vitória de Rivas foi a única explicitada abertamente em fontes cubanas, embora o chefe da DAAFAR (Defesa Antiaérea e Força Aérea Revolucionária Cubana) de 1987 a 1999, o general Rubén Martínez Puentes, tenha declarado que as vitórias foram várias: “Não foram poucas as aeronaves sul-africanas abatidas pelos nossos pilotos”. Uma delas foi a do tenente-coronel Eduardo Gonzáles Sarría, piloto de MiG-23, que reivindicou um Mirage abatido.
Segundo relatou Juan Ariel Toledo em dois artigos publicados no site da Universidade Central de Cuba “Marta Abreu” de Las Villas, fontes russas e polonesas também citam diversas vitórias dos MiG-23 cubanos. Vladímir Ilin, especialista em aviação do TsAGI da Rússia (Instituto Central Aero-Hidrodinâmico), concedeu aos MiG-23 em Angola três vitórias aéreas: 2 Mirage e 1 Impala e 1 Mirage que retornou danificado, mas caiu no pouso, possivelmente o de Piercy, somando um total de quatro vitórias entre 1987 e 1988. As fontes sul-africanas, por outro lado, negaram essas possíveis derrotas em combate aéreo.
FONTE: Russian Beyond
NOTA DO PODER AÉREO: Pilotos cubanos de MiG-23ML e sul-africanos de Mirage F1 tiveram vários encontros durante a intervenção cubana em Angola.
Os MiG-23s da FAPLA superaram os caças Mirage F1CZ e F1AZ da SAAF em termos de potência/aceleração, capacidades de radar/aviônicos e armas ar-ar.
Os mísseis R-23 e R-60 do MiG-23 deram aos pilotos da FAPLA a capacidade de enfrentar aeronaves da SAAF na maioria dos aspectos. A SAAF, prejudicada por um embargo internacional de armas, foi forçada a transportar uma versão obsoleta do míssil francês Matra R.550 Magic ou mísseis de primeira geração V-3 Kukri, que tinham alcance e desempenho limitados em relação aos R-60 e R-23.
Apesar dessas limitações, os pilotos da SAAF foram capazes de vetorar dentro do envelope de tiro e disparar mísseis ar-ar contra MiG-23s (fotogramas de câmeras de combate evidenciam isso). Os mísseis erraram ou explodiram ineficazmente no rastro de ar quente do jato, em vez de atingir a fuselagem quente (ver foto abaixo).
Os rebeldes da UNITA, que se opunham às forças cubanas/MPLA, abateram vários MiG-23 com mísseis FIM-92 Stinger MANPADS fornecidos pelos Estados Unidos. As forças terrestres sul-africanas abateram um MiG-23, que estava realizando um ataque à barragem de Calueque, usando o canhão Ystervark (porco-espinho) 20 mm AA.