Detalhes técnicos da versão AEW&C do Embraer Praetor 600
Por Sérgio Santana*
No decorrer da edição 2019 do 53º Salão Internacional de Aeronáutica e Espaço que ocorrerá até o dia 23 deste mês no Parque de Exposições de Bourget em Paris, a Embraer e a Israeli Aerospace Industries (IAI) anunciaram uma parceria que resultou na versão Alerta Antecipado e Controle Aerostransportado do Embraer Praetor 600. De acordo com o comunicado conjunto, a aeronave oferece desempenho superior e flexibilidade que se traduz na proposta de maior valor em sua categoria, podendo ser facilmente configurada para atender às necessidades do cliente e executar uma ampla variedade de missões de uma maneira muito eficiente e econômica, com esta colaboração sendo parte da da nova estratégia da IAI em intensificar colaborações com entidades de negócios globais, alavancando o know-how e a tecnologia acumulada ao longo de décadas de operações aeroespaciais e de defesa.
A companhia israelense foi a primeira a produzir uma aeronave de AEW&C baseada em um jato executivo, o IAI Eitam, descrito pelo Poder Aéreo aqui, o que forneceu as bases para esta versão militar do Praetor 600.
A aposta no sucesso da nova aeronave se deve à crescente demanda por aeronaves dedicadas a missões de Alerta Antecipado e Controle Aerotransportado, caracterizada por duas razões principais: a miniaturização dos radares e demais equipamentos de missão (o que torna possível a sua instalação em aeronaves menores que um Boeing E-3 Sentry, por exemplo, daí resultando em menores custos de aquisição e operação) e a possibilidade, naturalmente característica do conceito, em transformar uma aeronave de AEW&C em uma plataforma multiplicadora de forças, possibilitando que cada exemplar atue como um centro de controle autônomo coordenando aeronaves e outros meios de combate, dentro da teoria da Guerra Centrada em Redes (Network Centric Warfare, NCW).
O Praetor 600
Lançado em outubro de 2018, o Praetor 600 é uma versão aperfeiçoada do Legacy 500, caracterizada principalmente por maior alcance, que foi obtido às custas de um par de winglets (com 57 cm a mais de altura em relação aos instalados no Legacy 500) e dois tanques de combustível (à frente e atrás das asas, totalizando 1.328 kg, em uma modificação que não alterou o centro de pressão nem o centro de gravidade da aeronave, cuja estabilidade é artificial, assegurada por comandos Fly-By-Wire redundantes e acionados por joysticks laterais, como nos Airbus)
Como resultado destas modificações, uma tripulação de dois pilotos pode conduzir até 12 passageiros por uma distância de até 7.441km, à velocidade máxima de 870km/h (regime de cruzeiro de alta velocidade, embora possa atingir o máximo de 880km/h), com o teto máximo de serviço sendo de 13.716 metros. A aviônica de navegação é da linha Rockwell Collins Pro Line Fusion, contando com Head Up Display e Sistema de Visão Sintética. O Praetor mede 20.74 metros de comprimento, 6.41 metros de altura e 21.50 metros de envergadura, sendo propulsado por dois turbofans Honeywell HTF7500E, cada um gerando 3.414kg de empuxo.
Equipamento de Missão
O principal sensor da versão militar do Praetor 600 é o radar ELTA EL/M-2096. Representando a última evolução do EL/M-2075, o primeiro radar de varredura eletrônica desenvolvido para missões AEW&C e atualmente equipando uma única aeronave (o IAI Condór da Força Aérea do Chile), o EL/M-2096 atua na Banda S (2-4 GHz) e apresenta uma capacidade de varredura de 240º (120° para cada lado), com seus módulos transmissores/receptores sendo compostos por Nitreto de Gálio, à semelhança dos módulos do Saab Global Eye, possibilitando maior sensibilidade contra alvos de baixa visibilidade radar, além de alcance ampliado em relação aos modelos anteriores. Ainda não foi divulgado um número acerca desta última característica, mas há fundadas razões para se acreditar que seja bem além do alcance do radar instalado no Condór chileno (400 km), da mesma forma que o radar Erieye ER instalado no Global Eye possui alcance divulgado como sendo 40% maior que o do Erieye da primeira geração. Também é digno de nota que o EL/M-2096 terá um sistema de Identificação Amigo/Inimigo integrado (IFF, Identification Friend or Foe), sistema esse que nas aeronaves de Alerta Antecipado Aerostransportado costuma apresentar um alcance ainda maior que o radar de missão em si.
Complementando o radar EL/M-2096 foi publicado que a versão do Praetor 600 dedicada às funções de AEW&C terá uma suíte com variadas opções de sistemas de autoproteção, inteligência eletrônica e de comunicações, de acordo com as necessidades específicas de cada cliente, seguindo uma tendência empregada pelo já mencionado Global Eye, de modo a não apenas possibilitar a diminuição dos custos operacionais e de aquisição, mas também a atrair a atenção dos operadores para um produto sob medida.
As revelações da imagem “congelada” do “P600 AEW” e possíveis alterações internas
Em um projeto aeronáutico diz-se que sua configuração está “congelada” quando se apresenta definitiva ou que sofrerá quase nenhuma alteração até sua entrada em serviço. A imagem “congelada” da versão de AEW&C do Praetor 600 já permite ver algumas características visuais que certamente permanecerão no seu projeto, como a instalação do compartimento da antena do EL/M-2096 em ângulo inclinado em relação à fuselagem para permitir que o radar permaneça alinhado com o horizonte enquanto a aeronave voa “cabrada” (com alguns graus de ângulo de ataque), a fim de continuar na velocidade que lhe proporcione o maior tempo de vigilância possível. Como uma consequência desta característica foi instalado um par de aletas sob a porção posterior da fuselagem. Ressalte-se que ambas as soluções foram empregadas no processo de conversão do EMB-145LR em R-99A (denominação que foi alterada para E-99 em 2008).
Outras características externas são o domo de comunicações por satélite (SATCOM) sobre o cockpit, à semelhança do que existe nas versões do EMB-145 AEW&C operacionais nas forças aéreas da Índia (onde é denominado EMB-145I “Netra”, olho) e do México (na qual é conhecido informalmente como “Fortaleza”) e as protuberâncias laterais que alojarão os dispositivos de inteligência eletrônica e de comunicações, presentes no “Netra”.
Apesar do alcance notável do Praetor 600 em sua versão civil (mais que o dobro do já mencionado EMB-145LR, com seus 3.000km) as alterações no formato aerodinâmico da aeronave (causadas pelo compartimento da antena, adição de aletas e protuberâncias de dispositivos), geram peso e arrasto, influindo diretamente não apenas no alcances e velocidades possíveis, mas também no número de horas em que a aeronave permanecerá orbitando na sua área de missão (item vital para um vetor AEW&C), o que pode determinar a instalação de tanques internos de combustível, tal como ocorreu na conversão do EMB-145LR em R-99A/E-99. No caso do Praetor 600, boa parte do espaço interno originalmente concebido para abrigar confortavelmente até 12 pessoas, pode servir, além de reservatório de combustível, também para alojar uma nova APU, geradores elétricos e um sistema de refrigeração mais potente, destinados respectivamente a fornecer energia para os equipamentos de missão e mantê-los em temperatura adequada ao seu funcionamento.
Substituto dos E-99 na FAB?
A versão de AEW&C do Praetor 600 não foi concebida para substituir a frota de cinco E-99 da Força Aérea Brasileira (que se encontram em processo de modernização, após o qual serão denominados E-99M e terão pela frente ao menos mais uma década de serviço. Uma aquisição deste tipo não resultaria em retorno adequado ao que foi investido pelos parceiros do programa), mas para ser oferecida ao mercado de exportação, notadamente para os países de orçamento de defesa baixo, mas que pretendem ter o potencial que a aeronave pode oferecer.
*Bacharel em Ciências Aeronáuticas (Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL). Pesquisador do Núcleo de Estudos Sociedade, Segurança e Cidadania (NESC-UNISUL). Pós-graduando em Engenharia de Manutenção Aeronáutica (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC/MG). Autor de livros sobre aeronaves de Inteligência/Vigilância/Reconhecimento. Único colaborador brasileiro regular da Shephard Media, referência em Inteligência de Defesa.