Rafale na Índia: acordo de 36 caças sob fogo do ex-ministro da Defesa, no Congresso

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Ex-ministro da Defesa AK Antony foi acusado pelo atual mandatário da pasta, Manohar Parrikar, de ter ‘matado’ o acordo original de 26 caças ao acolher diversos questionamentos. Em resposta, Antony usou como munição as questões contra o Rafale levantadas por líderes do partido hoje no governo, na época em que eram opositores

O assunto do Rafale nesses últimos dias esteve mais quente, na política indiana, do que as tubeiras de seus motores Snecma M88 em pós-combustão. Após sofrer críticas (mas também elogios) de especialistas em defesa em artigos divulgados na mídia local, o anúncio de um acordo governo a governo para a compra de 36 caças Dassault Rafale pela Índia, feito no mês passado, está agora sob ataque do Congresso Indiano. E, na ponta de lança, está a figura do ex-ministro da Defesa AK Antony, líder sênior na casa e agora na oposição.

No sábado, 23 de maio, Antony levantou diversas questões sobre a compra, segundo o jornal Times of India, entre elas dúvidas sobre a participação do Ministério das Finanças e do Conselho de Aquisições de Defesa na hora de se costurar o acordo governo a governo com os franceses. Essas críticas aparecem em meio a várias outras do balanço que a oposição está fazendo ao se completar o primeiro ano do governo do primeiro-ministro Narendra Modi.

Vale lembrar que o acordo para compra “de prateleira” (disponíveis pelo fornecedor para compra rápida, a chamada “fly-away condition”) de 36 caças Rafale da empresa aeronáutica francesa Dassault, a um valor que se estima que vai superar 6 bilhões de dólares, foi anunciado em abril durante a visita de Modi à França. No anúncio, foi dito que essa compra de prateleira era um acordo governo a governo à parte do contrato em negociação desde 2012 para a compra de 126 aeronaves, 108 delas a serem fabricadas na Índia com transferência de tecnologia da Dassault para a estatal indiana de aviação HAL. Esta longa negociação referia-se ao chamado programa MMRCA (avião de combate multitarefa de porte médio), concorrência internacional na qual a oferta da Dassault francesa foi selecionada como a de menor valor (ofertante L1), vencendo outros cinco fabricantes do mundo.

Governo e oposição – O ex-ministro da Defesa afirmou no sábado que diversos líderes do BJP (Bharatiya Janata Party, o partido popular), entre eles figuras proeminentes como Yashwant Sinha e Jaswant Singh, se opuseram à compra do caça francês durante o governo passado, da UPA (aliança progressiva), dentro do mais abrangente programa MMRCA, quando ele era ministro. Vale lembrar que hoje o BJP é o partido que governa a Índia, tendo à frente o primeiro ministro Narendra Modi.

Antony também disse que o ministro das Finanças, naquela época, não apoiou o acordo do Rafale, pois um novo conceito para selecionar um vencedor havia sido introduzido no programa. Neste, a escolha do melhor avião se baseava no custo do aparelho não só no momento da aquisição, mas ao longo do ciclo de vida. As divergências sobre esses cálculos levaram a vários questionamentos e atrasos para se fechar o negócio, além de outros pontos como as garantias do fabricante francês aos caças a serem produzidos na Índia.

Fogo cruzado – Segundo reportagem do jornal Deccan Herald também publicada no sábado, Antony está respondendo diretamente a uma alfinetada feita pelo atual ministro da Defesa, Manohar Parrikar. Este afirmou que o ex-ministro havia “matado” o acordo do MMRCA com os diversos questionamentos que colocou no projeto.

Em resposta, Antony agora acusa o governo Modi de comprometer a segurança da nação ao diminuir os gastos de defesa, e diz que tomou ações corretas quanto ao MMRCA. Antony afirmou: “Diversos líderes do BJP, incluindo Yashwant Sinha, escreveram para mim alegando que a seleção do ofertante L-1 (a oferta de menor valor, nesse caso a do Rafale) era irregular, injustificável e sem mérito.”

AK Antony também insistiu que para esse tipo de compra nem o primeiro-ministro nem o ministro da Defesa ou as Forças Armadas poderiam adquirir qualquer equipamento passando por cima do Conselho de Aquisições de Defesa. E, sobre os acordos de transferência de tecnologia que faziam parte do programa MMRCA, o ex-ministro questiona como essa compra “de prateleira” faria sentido num governo que enfatiza a política “Make in India” (fabrique na Índia).

Além do acordo governo a governo dos 36 caças Rafale, Antony também criticou outra decisão de Modi, que é a diminuição do Corpo de Ataque de Montanha, ao longo da fronteira com a China. Isso num momento em que os chineses possuem uma superioridade de 3 para 1 sobre os indianos.

Preço não transparente – Neste domingo, as críticas do Congresso Indiano à decisão do governo Modi sobre o Rafale prosseguiram, segundo reportagem do jornal The Hindu. O porta-voz do Congresso, Tom Vadakkan, disse a repórteres em Goa que a decisão anunciada pelo primeiro-ministro na França, de comprar 36 caças Rafale “de prateleira”, é “totalmente não transparente”. Vadakkan prosseguiu: “Até hoje, nem mesmo o preço da aeronave foi revelado pelo governo Modi. A Índia não tem um acordo com a França para compras governo a governo. Na ausência deste, como podem os procedimentos já estabelecidos de compras de defesa serem sobrepujados?”

O porta-voz e líder no Congresso disse não haver clareza sobre a transferência de tecnologia, e que “o governo Modi precisa esclarecer se o governo francês dará alguma garantia de soberania.” Vadakkan também lembrou que o processo de concorrência realizado no governo anterior prescrevia que apenas 18 caças Rafale seriam fornecidos diretamente pelo fabricante, e que “os demais 108 aviões seriam fabricados pela Hindustan Aeronautics Limited (HAL) sob um acordo de transferência de tecnologia.” Usando a expressão empregada pelo próprio governo Modi, o líder acrescentou: “Isso teria garantido (a política) ‘Make in India’, com criação de milhares de empregos e transferência de crucial tecnologia de ponta.”

Por fim, Vadakkan reforçou as críticas do ex-ministro AK Antony sobre o que considera uma “decisão unilateral”, afirmando que “nem o primeiro ministro nem qualquer autoridade pode fazer uma compra unilateral sem aprovação prévia do Conselho de Aquisições de Defesa.”

FOTOS: Força Aérea Francesa (em caráter meramente ilustrativo)

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