Primeiro YF-16A, em 20 de outubro de 1976

Depois do caça F-86, os projetistas americanos desenvolveram uma crescente fascinação pela sofisticação nos caças, pela incorporação do avanço nas tecnologias. Mas as aeronaves foram se tornando cada vez maiores, com preços cada vez mais elevados e redução nos números da frota.

Do P-51 ao F-15 Eagle, cada novo caça americano custou em média 2,4 vezes mais que seu antecessor, mas o F-15 em 15 anos de produção não atingiu 1/10 da produção de 15.000 Mustangs, fabricados em 1/3 do tempo.

O F-104 deveria ter se tornado o equivalente americano ao MiG-21, mas como o F-100 Sabre, acabou virando um caça-bombardeiro, ao invés de um caça “puro”, tarefa para a qual não obteve sucesso no Vietnã. A USAF acabou tendo que usar o caro e pesado F-4 Phantom II para enfrentar o ágil, leve e barato MiG-21.

F-104 Starfighter

O Phantom II tinha sido desenvolvido originalmente como interceptador para a Marinha dos EUA, jamais tinha sido imaginado como “dogfighter”. Sua aquisição pela USAF por imposição política era considerada anátema pela Força.

Sobre o Vietnã, os pilotos americanos não conseguiram repetir as “kill rates” favoráveis da Guerra da Coreia. Ao invés de 10:1 (mais recentemente revisada para baixo), a “kill rate” caiu para 3:1 e depois tornou-se favorável aos vietnamitas.

Parte do problema era o dogma de que os dias do “dogfight” tinham acabado e que os mísseis resolveriam todos os problemas.

Em 1965, a USAF começou a formular o conceito do seu Fighter Experimental (FX), que deu origem ao F-15 e o Advanced Day Fighter (ADF), que resultou no F-16.

O FX acabou ficando mais pesado para enfrentar o surgimento do MiG-25 Foxbat, capaz de atingir Mach 3. Para John Boyd, que teve  forte influência no F-15, o caça acabou ficando mais pesado e não saiu como ele imaginava inicialmente.

Mas Boyd conseguiu influenciar com mais força o projeto do ADF, juntamente com Pierre Sprey, que trabalhava como assistente do Secretário de Defesa, como analista de sistemas. Os dois formavam a “Fighter Mafia”, juntamente com o piloto de testes Charles E. Meyers.

Segundo Boyd, “a manobrabilidade é um problema de energia”. Quando você manobra uma aeronave precisa de energia, pois perde-se energia ganhando altitude, velocidade ou ambos. Normalmente perde-se energia fazendo curvas.

O que acontece é que o arrasto supera o empuxo, e nesse ponto tem-se uma taxa de energia negativa. A taxa negativa tem que sair da altitude, velocidade ou de uma combinação das duas. Atinge-se um ponto, mesmo com usando “after-burner” (pós-combustor), no qual o arrasto é maior que o empuxo. Nessa situação de vetor negativo, multiplica-se o arrasto pela velocidade, e tem-se quanta energia é preciso para o caça se elevar.

Nasce o YF-16

 

A teoria E-M de Boyd mostrou que o FX necessitaria de um motor com uma razão potência-para-peso significativamente melhor que os projetos daquele tempo. O motor turbofan F-100 selecionado para o  F-15, acabou também criando a possibilidade de equipar um caça leve monomotor com alta performance.

Mas o pensamento tradicional da USAF antes de 1970 igualava peso leve com curto alcance. Em algum grau, isso era justificado pela tecnologia dos anos 1950 usada no MiG-21, que tinha “pernas curtas”.

No final dos anos 1960, Boyd e Sprey planejaram um caça designado F-XX, com peso de 25 mil libras (11.340kg), dedicado à superioridade aérea de alta persistência. Estudos posteriores conseguiram reduzir esse peso para 17.000lb (7.700kg).

O conceito de Boyd encontrou muita oposição, pois muitos o viam como uma ameaça ao pensamento tradicional e para o projeto do F-15 Eagle.

Em 1971, Boyd estava trabalhando para o Air Force Prototype Study Group. Consequentemente, ele pode empurrar o conceito num tempo em que os testes de voo competitivos de protótipos estavam retornando à voga, depois dos controversos pacotes de aquisição que resultaram no F-111.

O vice-secretário da Defesa David A. Packard conseguiu fazer o projeto LWF (Lightweight Fighter) sair da prancheta, seguindo os parâmetros definidos pelo secretário da USAF, Robert C. Seamans, que definiu que as verbas seriam limitadas, com metas de performance e especificações militares mínimas. Não havia garantia nenhuma de que encomendas seriam feitas.

Quatro contratos de US$ 100 milhões foram fechados para o Programa LWF em 1972, com a General Dynamics ficando com US$ 38 milhões para desenvolver e voar dois YF-16, enquanto a Northrop ficou com US$ 39 milhões para dois protótipos do rival YF-17.

A Pratt & Whitney também recebeu para desenvolver uma versão modificada do turbofan F100 e a General Electric para o novo motor YF101.

Quando a USAF submeteu a RFP à indústria para o LWF, ela especificou três objetivos: o projeto resultante deveria explorar totalmente as vantagens das tecnologias emergentes, reduzir os riscos de incertezas envolvendo o desenvolvimento e a produção em escala do novo caça e prover o DoD com uma variedade de opções tecnológicas que satisfizessem as necessidades de hardware dos militares.

Ao invés de tentar superar os dados técnicos dos caças russos, a USAF decidiu otimizar o LWF para altitudes operacionais de 30 a 40 mil pés (9 a 12 mil metros) e velocidade de Mach 0.6 a 1.6, sem tentar igualar a performance do MiG-25 Foxbat.

O LWF não foi projetado tendo em vista o canto superior direito do envelope de performance, mas para uma vasta gama de condições de voo, com ênfase em taxa de curva, aceleração e alcance. Esta combinação de parâmetros permitiriam ao caça interceptar e engajar o MiG-21, MiG-23, Su-7 e o Su-24.

Decola o LWF

O LWF tinha metade do peso do F-15, custo muito mais baixo, pequeno tamanho e alta performance em velocidades abaixo de Mach 1.6 e altitudes abaixo de 40 mil pés.

A indústria reconhecia que apesar da hostilidade da USAF, as variantes do LWF tinham grande potencial de exportação pelo FMS, incluindo a substituição do F-104 na Europa. Projetos da Boeing, General Dynamics, LTV, Northrop e Rockwell foram apresentados.

A Northrop propôs um projeto de dois motores, de olho num projeto de desenvolvimento para substituir o F-5 como caça de exportação. Os projetos da Boeing e a General Dynamics eram claramente os líderes desde o começo e o projeto da Northrop o mais fraco dos seis.

Mas no meio do processo da competição, alguns compradores potenciais do exterior manifestaram preocupação em comprar aviões monomotores, por causa do recorde de acidentes do F-104. A USAF então decidiu que um dos dois competidores finalistas deveria ter dois motores. A Northrop era a única competidora com um projeto bimotor e foi selecionada por “default”.

Quando a General Dynamics teve seu projeto selecionado por mérito, a Boeing ficou um pouco irritada com sua derrota, devido à mudança de regra no meio da competição pela USAF, mas não protestou da decisão.

Dos dois projetos sobreviventes, agora designados General Dynamics YF-16 e Northrop YF-17, o último era um projeto relativamente convencional, até um certo ponto uma ampliação do F-5, enquanto o YF-16 era um desenho completamente novo, incorporando muitas tecnologias inovadoras, que iam além do caro F-15. Entre elas:

  1. Fly by Wire. O YF-16 não tinha conexão direta entre o piloto e as superfícies de controle da aeronave. Ao invés disso, o manche e os pedais eram conectados a computadores quádrulos redundantes que diziam aos profundores, ailerons e leme o que fazer. Isto dava várias vantagens em relação aos antigos sistemas. Tinha resposta mais rápida, automaticamente corrigindo rajadas e termais sem esforço do piloto. Podia ser programado para compensar problemas aerodinâmicos e voar como um avião ideal. E, mais importante, possibilitou uma forma segura de voar um projeto de instabilidade controlada.
  2. Estabilidade negativa. Todos os projetos anteriores eram aerodinamicamente estáveis, isto é, o centro de gravidade era bem na frente do centro de sustentação e do centro de pressão (arrasto). O YF-16 foi o primeiro caça aerodinamicamente instável. Com o centro de gravidade bem atrás, a tendência do avião é elevar o nariz e baixar a traseira. O voo nivelado é criado com o profundor elevando a traseira, trabalhando junto com as asas ao invés de ir contra elas, reduzindo o arrasto. A aeronave está sempre no limite do voo controlado, com uma tendência de nariz para cima, que é controlada pela fly-by-wire.
  3. Altas cargas “G”. Os caças anteriores tinham um limite de 7Gs, principalmente pela limitação humana, mesmo com o emprego de trajes G. Mas o assento do piloto do YF-16 foi reclinado 30 graus, muito além dos 13 graus convencionais. Assim, a habilidade dos pilotos de suportar Gs foi elevada a 9Gs, reduzindo a distância vertical entre o coração e a cabeça. Adicionalmente, o tradicional manche central foi substituído por um lateral, com o braço do piloto sendo apoiado para suportar o peso 9 vezes maior que o normal.
  4. Visão do piloto. Em adição à visão 360 graus e visão lateral sem precedentes, o canopy do YF-16 foi projetado sem arcos frontais no hemisfério frontal.
  5. Prevenção de crescimento: Tradicionalmente, espaço para crescimento era considerado um ativo. Caças adquiriam peso à medida que novas capacidades era adicionadas, o custo subia e a performance caía. O F-15 foi feito com espaço de sobra para crescimento, já o YF-16 foi feito propositadamente para não crescer.
  6. Raio de combate e persistência: A General Dynamics escolheu uma turbina turbofan, essencialmente a mesma do F-15. Usando uma só turbina ajudou a reduzir o peso e o arrasto. Usando um turbofan ao invés de jato puro, obteve alta eficiência no consumo de combustível. Adicionalmente, os projetistas criaram um design “blended body”, com a asa gradualmente engrossando na raiz e fundindo-se com a fuselagem, sem a junção visível usual. Essa solução criou espaço para combustível. Com uma alta fração de combustível e motor de alta eficiência, o YF-16 quebrou o preconceito que dizia que aeronaves pequenas tinham pouco alcance.
  7. Integração com radar: O YF-16 não levava mísseis guiados por radar, só mísseis guiados por calor de alcance visual. Seu pequeno tamanho e espaço limitavam o alcance do seu radar. Entretanto, foi equipado com um pequeno radar avançado, com excelente capacidade “look-down”. Mais importante ainda era a integração do radar para o combate visual, que projetava uma imagem no HUD mostrando exatamente onde estava localizado o alvo.

O competidor YF-17 que era maior que o YF-16, tinha dois motores a jato puro, mas sua aceleração era melhor, pois o “fan” tem um “delay” maior para sair do “idle” para “full power”.

A Northrop argumentava que seu projeto de dois motores tinha mais segurança, citando a experiência do F-5. A USAF não foi persuadida, em parte porque um avião de dois motores que perde um motor em combate é praticamente inútil e a probabilidade de falha no motor dobra quando se tem dois deles.

O caça de mais alta performance, com melhor manobrabilidade transiente, maior alcance e mais baixo custo saiu vencedor e em 1976, o YF-16 foi escolhido no lugar do YF-17.

A USAF estava então numa posição desconfortável de ter um projeto de caça leve que podia manobrar mais e ter maior alcance que seu “orgulho e jóia”, o F-15 de superioridade aérea. Em condições de combate reais, em velocidades de Mach 1.2 ou abaixo, o F-16 tinha uma significativa vantagem sobre o F-15. Até certo ponto, o problema foi resolvido com a designação do F-16 como “swing fighter”, para as funções ar-ar e ar-solo, enquanto o F-15 continuou com a missão puramente ar-ar.

YF-16 e YF-17

Provavelmente o maior ativo do F-16 no seu desenvolvimento foi sua grande impopularidade com o “establishment” da USAF. Sabendo que seu avião estava em constante ameaça de ser cancelado, os engenheiros da General Dynamics foram inspirados a fazer todo o possível para manter a performance e  prevenir o crescimento. Por exemplo, o F-15 tinha aproximadamente 25% de titânio, o F-16 foi limitado a 2%. Foi usada também uma entrada de ar fixa para baixar o custo, embora uma variável pudesse dar melhor performance acima de Mach 1.5.

O F-16 foi desde então um sucesso em todos os sentidos. A USAF o utilizou pesadamente e com sucesso em missões ar-solo na Guerra do Golfo de 1991 e em todos os outros conflitos. A Força Aérea de Israel também teve grande sucesso no seu emprego.

O conceito original de caça diurno foi perdido antes do início da produção em série, com a fuselagem sendo estendida como a versão biplace, com capacidade ar-solo adicionada. Ao longo das versões produzidas, o F-16 foi se tornando maior, mais pesado e mais capaz, incluindo o míssil AMRAAM e mais ponto duros para armas. Mesmo assim, ele não ganhou tanto peso quanto poderia ganhar e desse modo o trabalho de John Boyd não foi em vão.

E o YF-17?

O Northrop YF-17 (apelidado de Cobra) foi aproveitado na nova competição VFAX. Ele acabou se transformando no F/A-18 Hornet e foi adotado pela US Navy e pelo US Marine Corps, para substituir o A-7 Corsair II e o F-4 Phantom II, complementando o F-14 Tomcat.

Alguns criticaram a Marinha, que outrora “forneceu” caças à Força Aérea e agora tinha selecionado o perdedor da concorrência da USAF.

O projeto original, que seguiu o conceito de caça leve idealizado por John Boyd, ironicamente acabou crescendo até virar o F/A-18E/F Super Hornet dos dias atuais, que tem tamanho similar ao F-15. O Super Hornet acabou substituindo o F-14 no inventário da US Navy, onde realiza as tarefas de caça, avião tanque e guerra eletrônica.

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