F-X2, o Dia do Aviador e a vitória que não foi anunciada

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Hoje, dia 23 de outubro, é Dia do Aviador. Mas também era a data marcada para a visita de Estado que a presidente Dilma Rousseff faria aos EUA. Além do encaminhamento (ao menos retórico) de algumas pendências entre os países, especulava-se que essa viagem poderia render uma boa notícia para a FAB (Força Aérea Brasileira). Parte da imprensa nacional e internacional acreditava que, durante a viagem, ou mesmo pouco antes ou depois da visita de Estado aos EUA, a presidente anunciaria o caça F/A-18 E/F Super Hornet da Boeing como o vencedor do programa F-X2, que visa a aquisição de 36 caças para renovar parte da frota de aviões de combate da FAB.

Porém, com o desgaste provocado pelas revelações dos documentos secretos, mostrando a espionagem da agência norte-americana em telefonemas e e-mails de autoridades do país, não só a viagem foi cancelada como o anúncio de um vencedor para o F-X2 foi adiado. Ao final do mês de setembro, a validade das propostas dos três concorrentes foi mais uma vez prorrogada por seis meses. Não é difícil imaginar que, tanto tempo depois da apresentação da melhor e última oferta (BAFO, em inglês) de cada consórcio, muitas das condições ali contidas terão que ser revistas quando da assinatura do contrato (se é que isso ocorrerá algum dia).

As oportunidades perdidas

Isto é extremamente nefasto para o País. Primeiramente porque o Comando da Aeronáutica não consegue se programar no longo prazo (as autoridades civis respondem sempre que a decisão ocorrerá “em breve”), e necessita realizar verdadeiros malabarismos para manter uma força dissuasória mínima. Em segundo lugar, o País perde o melhor momento para negociar o financiamento, uma vez que o quadro econômico brasileiro se deteriorou, quando comparado com o poucos anos atrás. Por último, é importante citar as perdas em relação às oportunidades de desenvolvimento tecnológico e contrapartidas industriais.

Esta última questão merece alguns exemplos para cada uma das três propostas finalistas.

Quanto ao Super Hornet da Boeing, poderíamos estar participando das decisões, em conjunto com a Marinha dos EUA (que opera cerca de meio milhar de exemplares da aeronave), que envolvem a atualização do programa de desenvolvimento do caça, o que inclui melhorias nos motores, tanques conformais e casulos para armas externos de baixa observabilidade (o projeto do casulo poderia ser customizado para o lançamento de artefatos nacionais, por exemplo).

No caso da proposta da sueca Saab, perdemos a oportunidade de entrar no início do programa de desenvolvimento do Gripen E/F (embora ainda haja algumas coisas a serem feitas). Quem soube negociar bem foram os suíços, que conseguiram entrar no programa num momento muito favorável, quando a Saab necessitava de um acordo internacional para viabilizar o projeto. Definitivamente, os suíços usaram sua condição de primeiro cliente internacional (o que ainda pode necessitar de ratificação por referendo popular) e conseguiram negociar importantes vantagens econômicas, financeiras e industriais.

Por fim, no caso do caça francês  Dassault Rafale, vale lembrar que em sete de setembro de 2009 o ex-presidente Lula chegou a anunciar o início de negociações para sua futura aquisição, porém antes que a análise dos três concorrentes fosse finalizada por comissão da FAB (COPAC – Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate), num “atropelo” que acabou fazendo o Governo voltar atrás no anúncio. Porém, caso o Governo tivesse mantido sua decisão pelo Rafale, mesmo meses depois quando as análises ficaram prontas, o Brasil poderia ter negociado com os franceses diversos itens do padrão F4 do Rafale, como a customização do radar AESA (varredura eletrônica ativa) e novas gerações de outros sensores.

Trégua no ‘front’ político para o F-X2: uma necessidade do País

Há quem diga que nada será decidido até o final desse ano. Muitos afirmam que, ao longo de um ano eleitoral como 2014, nada será anunciado a respeito de compra de caças. A não escolha de um vencedor tem se tornado frequente nos anos onde há eleição presidencial. Em 2002, o então presidente Fernando Henrique Cardoso decidiu não convocar o Conselho de Defesa Nacional (CDN) para escolher o vencedor do então chamado Programa F-X, temendo a contaminação da campanha daquele ano pelo tema (mesmo assim o CDN decidiu pela reforma dos aviões P-3 de vigilância marítima e a compra dos CN-295 de transporte). Na eleição passada (2010), quando o programa em questão já era o atual F-X2, o tema também foi deixado de lado para evitar qualquer desgaste que a candidata da situação viesse a sofrer com um eventual anúncio.

No entanto, está mais do que claro que esse processo já se arrastou muito além do que deveria, criando problemas para a Defesa Aérea nacional. É chegada a hora de se criar uma trégua política, abrindo assim espaço para uma decisão racional e necessária. Situação e oposição precisam buscar um entendimento para o bem do País. Isto já foi obtido em outras oportunidades, para outros temas nacionais. Por que não fazer o mesmo com o assunto F-X2, buscando um acordo em que uma decisão, por qualquer um dos concorrentes, não seja usada como munição eleitoreira? Uma trégua no front político beneficiaria a todos, e assim o Brasil deixaria de perder oportunidades econômicas, tecnológicas, industriais e de promover sua dissuasão, como vem perdendo há mais de uma década.

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