Conheça os (prováveis) futuros caças da Argentina
Aquela negociação não seguiu em frente. Desconhecemos o motivo, mas pelo que nós vimos em relação aos F-5 adquiridos pela FAB do mesmo usuário, os Mirage F1 também não deveriam estar em boas condições. A diferença é que o Brasil comprou os F-5 com o propósito de modernizá-los extensivamente. Já a Argentina, aparentemente, necessita de um caça que esteja pronto (ou pelo menos próximo disto) para operar. E neste quesito a opção espanhola parece muito interessante a atrativa.
O F1 na Espanha
O Mirage F1 foi um avião muito importante para a Força Aérea Espanhola. Ele representou uma guinada na aviação de caça do país que anteriormente se apoiava em três dezenas de obsoletos caças F-4C Phantom II usados e outro número de Mirage III.
Com o F1 a Espanha finalmente obteve um interceptador moderno (para a década de 1970) e em quantidade expressiva (veja o texto abaixo). Até recentemente o avião executava missões importantes, como o policiamento aéreo dos Países Bálticos, num revezamento mantido pelas forças aéreas dos países da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
O destacado papel dos F1 espanhóis só foi superado em 1985, com as primeiras entregas dos EF-18A Hornet. Mas mesmo assim ele continuou a ser uma aeronave respeitável dentro da Força Aérea. Atualmente a Espanha está recebendo o lote mais novo do caça Eurofighter Typhoon e estes são os verdadeiros substitutos dos F1 espanhóis. A despedida do F1 ocorreu no último dia 23 de junho. Quase uma centena de exemplares de Mirage F-1 serviu nas Alas 11 de Manises (Valência), 14 de Albacete e 46 de Gando (Gran Canária).
Histórico
A Espanha encomendou inicialmente dois lotes de caças Mirage F1CE (localmente conhecido como C.14). O primeiro deles compreendia 15 exemplares e as entregas começaram junho de 1975. Outros 10 aviões do mesmo modelo, solicitados em 1977, foram entregues entre 1978 e 1979. Com estes 25 aviões foram montados dois esquadrões na Base Aérea de Los Llanos (Albacete): o 141 e o 142 – ambos pertencentes à Ala 14 – dedicados à função de interceptação.
Um terceiro pedido foi feito em 1978. Este era composto por 48 caças, sendo 20 semelhantes aos anteriores (ou seja, do modelo F1CE), 22 da versão F1EE e oito bipostos F1BE. Os F1EE, embora fossem aeronaves multimissão com ênfase em operações ar-superfície, na prática formaram um esquadrão (o 462 da Ala 46) que tinha função de defesa aérea das Ilhas Canárias. E mesmo os F1C de Albacete realizavam com frequência exercícios ar-superfície. Havia também o esquadrão 111, da ALA 11, que operou os F1 até 1992, quando foram absorvidos pela Ala 14.
O modelo CE/BE receberam camuflagem de três cores (areia, verde e marrom) na parte superior e cinza claro na inferior. Já no modelo EE a parte superior era toda pintada de cinza médio.
Assim, a Espanha tornou-se um dos maiores operadores de Mirage F1 do mundo na década de 1980, comprando um total de 73 caças. Com o tempo, ocorreram atritos em função de perdas operacionais e novos caças seriam necessários para recompor a frota na década de 1990. Mas a linha de produção já havia sido fechada. A solução foi adquirir exemplares usados no mercado internacional.
Da França foram adquiridos quatro F1C e um F1B, entregues entre 1994 e 1995. E do Qatar foram comprados 11 F1EDA e dois F1 DDA. Com isso, surgiu um verdadeiro pesadelo logístico e operacional. A Espanha possuía, na metade da década de 1990, uma vasta frota de Mirage F1 de diferentes procedências e versões. Somente em termos de painel, existiam sete diferentes configurações.
Decidiu-se então por uma frota menor, porém coesa. Foram selecionadas as 52 células em melhores condições (nenhum dos caças usados adquiridos do Catar anos antes foi aproveitado e estes tornaram-se fonte de peças de reposição), que foram submetidas a um amplo processo de modernização.
Em 1996 a empresa francesa Thomson-CSF (agora Thales) ganhou o contrato para a modernização (avaliado em 96 milhões de dólares na época) dos aviões e espanhola CASA tornou-se a principal subcontratada. Outras empresas espanholas, como a Indra, também contribuíram para a modernização dos caças. O plano compreendia a modernização de 48 monopostos e quatro bipostos. O local dos trabalhos foram divididos entre as oficinas de Getafe (CASA – 35 aeronaves) e o Parque de Material e Albacete (Força Aérea Espanhola – 17 exemplares).
O processo começou em 1997. No ano seguinte voou o primeiro exemplar modernizado, que passou a ser conhecido como F1M. Os aviões receberam uma eletrônica que era considerada moderna no final da década de 1990, que incluía um cockpit equipados com um mostrador colorido do tipo LCD, novo HUD, novo sistema de navegação inercial associado ao GPS, novos e modernos equipamentos de comunicação.
Modificações importantes também foram introduzidas no radar Cyrano IV que recebeu quatro novos modos ar-superfície e ataque naval, incluindo compatibilidade com mísseis anti-navio AM.39 Exocet. Com o processo de modernização, os aviões tornaram-se verdadeiros caças multimissão. Outro detalhe que chama a atenção são dos dispensadores de flare e chaff focalizados abaixo do estabilizadores horizontais e um pouco acima da barbatana ventral (ver foto do início do texto).
O processo de modernização e padronização da frota também trouxe um novo padrão de pintura. Todos os F1M e F1BM passaram a exibir o padrão cinza claro de superioridade aérea. Esta nova tinta também era mais resistente à corrosão. Como detalhe, foi pintado um cockpit no dorso da aeronave, próximo ao nariz.
Opção viável
O Mirage F1 é considerado por muitos o melhor Mirage já desenvolvido pela Dassault antes da revolução eletrônica da década de 1970 com a introdução de comandos do tipo fly-by-wire, painéis dominados por MFD (multi-function Display) e outros recursos introduzidos naquela época. Para tentar reduzir este “gap” tecnológico, os espanhóis realizaram um extenso programa de modernização nos seus caças (ver texto acima). Mas hoje ele se encontra tão superado como qualquer outro caça de sua geração.
O problema é que os Mirage III da Argentina estão em “fase terminal” (completaram 40 anos no final do ano passado e nunca passaram por um profundo programa de modernização e atualização) e a VI Brigada Aérea necessita de novos equipamentos em caráter urgente. O Mirage III ainda é o principal interceptador operado pela FAA, sendo responsável pela defesa aérea da área no entorno da Capital Federal (semelhante ao papel do GDA no Brasil).
Além do problema da escassez de recursos e a falta de boas linhas de financiamento no exterior para a compra de modernos caças, a Argentina ainda possui desentendimentos com o governo de Londres e qualquer material bélico que conte com equipamento produzido no Reino Unido poderá ser embargado. O Reino Unido também poderá influenciar outros países (como os Estados Unidos) para que não repassem tecnologias militares de ponta para os argentinos.
Em função da obsolescência dos Mirage IIIEA, das condições econômicas do país e da situação geopolítica, a opção pelos F1 espanhóis parece ser bastante viável para a Argentina. Primeiramente estes caças estavam em operação até recentemente, e colocá-los na ativa na situação que se encontram não parece ser algo complexo. O valor real do negócio também não deve ser um impedimento (algo próximo de 50 milhões de dólares).
Pelas notícias veiculadas, a Argentina tem interesse em comprar um número suficiente para equipar um esquadrão (algo como oito e doze caças), além de algumas células para fonte de peças.
Os aviões passaram por um grande processo de modernização 14 anos atrás e representariam um salto considerável em relação ao material empregado pela VI Brigada atualmente. Com relação à eletrônica, estas aeronaves seriam comparáveis ou mesmo superiores aos A-4AR da V Brigada Aérea, atualmente considerados os caças argentinos mais atualizados. Além disso os F1M possuem capacidade de operar mísseis AM.39 Exocet, o terror da Frota Britânica em 1982.
Por último, os F1M parecem ser ideais para ocupar uma lacuna entre a atual desativação dos Mirage III e o futuro caça argentino. Este pode ser de procedência chinesa e construído localmente. Notícias recentes dadas pelo grupo britânico Jane’s IHS, dão conta de que a Argentina iniciou conversas com a fabricante chinesa Chengdu Aircraft Corporation (CAC) para a eventual fabricação do caça sino-paquistanês FC-1/JF-17. Para quem acha esta hipótese improvável, lembramos que a Argentina já fabrica sob licença o helicóptero CZ-11 chinês, um derivado do Esquilo da Helibras.
FOTOS: Força Aérea Espanhola (Ejército del Aire), e Força Aérea Argentina
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