Empresa do Programa Espacial Brasileiro paralisa obras na Base de Alcântara

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As denúncias são de fontes ligadas à ACS, que recebeu U$ 420 milhões em julho do governo federal

 

Cláudia Freitas

Em meio os últimos pronunciamentos do Ministério da Defesa sobre a necessidade de o Brasil possuir seu próprio satélite de comunicação militar, para não ficar vulnerável às espionagens como as denunciadas por Edward Snowden, funcionários da Alcântara Cyclone Space (ACS), empresa binacional criada pelos governos do Brasil e da Ucrânia para explorar os serviços de lançamentos de satélites em bases comerciais, com o foguete ucraniano Cyclone-4, atestam que as obras do programa estão completamente paralisadas.

Segundo fontes ligadas à Base Espacial de Alcântara, onde o programa é desenvolvido no país, cerca de dois mil contratados pela ACS foram dispensados nos dois últimos meses. O cenário no local é de abandono, como mostram as fotos enviadas ao Jornal do Brasil. A maioria dos equipamentos alugados já foi devolvido e aqueles que permanecem na base estão abandonados ao ar livre e sem qualquer manutenção, segundo as mesmas fontes.

A Alcântara Cyclone Space foi criada em 2003, no início do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que priorizou o Programa Espacial Brasileiro, considerando a ACS seu produto principal. A criação da empresa se deu por meio de um contrato de capital binacional, provindos parte do Brasil e, em maior proporção, da Ucrânia, que detém os direitos de fabricação e tecnologia aplicada no foguete Cyclone 4, que partirá do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA).

No mesmo período, um incêndio destruiu um grande trecho do CLA, durante o lançamento do foguete VLS. O fato gerou especulações sobre a possível desativação da base e transferência do programa espacial para outro estado, o que não aconteceu, assim como a completa recuperação da infraestrutura do lugar, após 10 anos do acidente. O Centro de Lançamento de Alcântara apresenta uma localização estratégica, próximo da linha do Equador e com a vantagem de ter o Oceano Atlântico a leste e ao norte. O que explica o fato dos foguetes lançados do local caírem no mar, longe de áreas habitadas.

As boas intenções prevaleceram no acordo inicial firmado entre a binacional ACS e o presidente Lula. O diretor-geral brasileiro da binacional, Roberto Amaral, assumiu o compromisso de trazer divisas para o Brasil, transferindo para os cientistas brasileiros a moderna tecnologia que a Ucrânia detinha, principal país no mundo a dominar a tecnologia espacial. A expectativa era de que os seis primeiros lançamentos comerciais acontecessem do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), em 2011. Para o estado do Maranhão, a ACS anunciou mudanças importantes, que chegariam com a geração de empregos para as obras no CLA e um novo planejamento urbano em Alcântara, para beneficiar os funcionários da empresa e toda a população do lugar. Escolas, hospitais e universidades seriam construídos com as verbas destinadas ao projeto.

De acordo com fontes ligadas à ACS, esse complexo funcionou nos últimos anos. O hospital erguido pela empresa dentro dos limites do CLA contava com tecnologia de ponta. A maioria dos funcionários da binacional eram moradores de Alcântara, muitos deles remanescentes das comunidades quilombolas que habitavam em massa a cidade de Alcântara. E foi na relação com as comunidades quilombolas que se deu um dos maiores imbróglios envolvendo a ACS. No momento em que a empresa binacional estava discutindo com o Ministério da Defesa o contrato de cessão de área de exploração dentro do CLA, o INCRA apresentou uma determinação judicial garantindo aos remanescentes quilombolas da cidade a posse de quase toda a península onde o CLA se situa.

A ação colocou por água abaixo a intenção do governo de expandir o programa espacial em outras partes de Alcântara. O projeto ficou limitado à área do CLA, ou seja, o sítio da ACS foi estipulado em menos de nove hectares da península. De acordo com o Ministério Público do Maranhão, há três ações propostas pelo órgão envolvendo esse caso. O MPF entende que a questão mais grave é o risco da perda de áreas tradicionais de comunidades quilombolas, por isso está movendo as ações, que tem o objetivo de garantir a integridade das comunidades. Pelas informações do MPF, em 2008 a Justiça Federal intimou a Agência Espacial Brasileira (AEB), por meio de acordo em que a Alcântara Cyclone Space e a AEB reconheceram os direitos dos quilombolas, havendo comprometimento, por parte da Cyclone Space, em realizar as obras somente no interior da área já demarcada ao CLA. A ação foi julgada com resultado favorável no mesmo ano da sua proposta pelo MPF. A outra ação é de 2003, objetivando garantir que nenhuma comunidade quilombola seja deslocada das áreas que ocupam atualmente e também exige ainda que elas tenham as suas áreas integralmente tituladas pelo INCRA. Esse processo ainda não foi julgado e está tramitando na 8ª Vara Federal de Justiça no Maranhão, enquanto o MPF aguarda pelo julgamento.

Os entraves não foram suficiente para conter novos investimentos destinados à ACS para trazer ao Brasil o Cyclone 4. Enquanto que nos limites do CLA somente o departamento de Recursos Humanos da empresa binacional está funcionando à pleno vapor, para demitir os pouco funcionários remanescentes de uma extensa folha de pagamento, na Câmara Federal o deputado Cláudio Cajado (DEM/BA) comemora a aprovação da proposta que ele sugeriu à Ministra Chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, resultando no aumento do capital da ACS em US$ 420 milhões, aproximadamente. A proposta foi aprovada pelo governo brasileiro no dia 29 de maio. Agora, o capital da binacional ACS passará de US$ 498 milhões para US$ 920 milhões.

O ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antônio Raupp, afirmou que o aumento de capital aconteceu porque os recursos destinados ao desenvolvimento do foguete Cyclone 4 e a construção da base de lançamento do veículo no CLA foram insuficientes. Segundo ele, os novos investimentos serão divididos em partes iguais entre Brasil e Ucrânia. Raupp estima que com a injeção dos recursos as obras poderão ser retomadas.

As denúncias recebidas pelo Jornal do Brasil também dizem respeito ao motivo da paralisação das obras. Segundo as fontes, ao dispensar os funcionários, os chefes dos departamentos alegavam que “isso [demissões] está acontecendo porque a empresa [ACS] não pagou as empreiteiras”. Segundo o ministro, essa informação não é verdadeira. “As obras não foram paralisadas. Apenas diminuíram de intensidade por causa do regime de chuvas na região. A ACS é devedora às empreiteiras, mas como essas empresas são grandes, as obras não são paralisadas porque se deixou de pagar um mês”, explicou Raupp, acrescentando que 40% das obras do sítio do Cyclone 4 estão concluídas.

FONTE / FOTO DE BAIXO: Jornal do Brasil

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