O F-X2 está morto, vida longa ao F-X…?

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Guilherme Poggio/Fernando “Nunão” De Martini

A afirmação acima pode parecer dramática para alguns, mas reversões de expectativas costumam ser assim mesmo. No início do mês de junho, havia um otimismo no ar em relação a uma decisão do programa F-X2 da Força Aérea Brasileira (FAB), especialmente entre os que viam como mais provável a escolha do caça F/A-18 Super Hornet da Boeing. A decisão pela proposta do fabricante norte-americano era dada como certa por vários meios da imprensa nacional e internacional. A visita em maio do vice-presidente dos EUA, Joe Biden, à presidente do Brasil Dilma Rousseff, acabou dando grande impulso a esta opção.

Para relembrar os nossos leitores, selecionamos alguns links  dentre diversas notícias que mostram bem o “clima” que havia até recentemente. É certo que a presença maior ou menor de notícias na mídia sobre um ou outro concorrente do F-X2, muitas vezes, segue caminhos que passam pelos departamentos de comunicação dos diretamente interessados no processo. Os dois outros concorrentes do F-X2, o sueco Saab Gripen e o francês Dassault Rafale, também já tiveram seus momentos de maior exposição na mídia. Porém, há bastante tempo não se via um conjunto de notícias mostrando haver grandes chances de uma decisão por um dos fabricantes da disputa, como estes exemplos selecionados abaixo:

Porém, em menos de um mês muita coisa no Brasil mudou, e foi para pior quando se pensa em economia e cacife político do atual Governo. Vários eventos de ordem econômica, social e política, com influência indireta no processo do F-X2, passaram a dominar o cenário interno do País. Vejamos, rapidamente, cada um deles.

Fatores de ordem econômica: a economia do Brasil, que já vinha definhando desde o ano passado, aprofundou um “derretimento” com a elevação do dólar, fuga de capitais estrangeiros e queda da bolsa de valores nestas últimas semanas. Lembremos que uma das grandes desculpas do ministro da Defesa Celso Amorim pela não decisão do programa F-X2, no ano passado, estava relacionada à incerteza e à instabilidade do quadro econômico. Não dá para dizer que, de lá para cá, os indicadores econômicos melhoraram. O caminho tem sido de piora em muitos deles.

Fatores de ordem social: ao longo do mês de junho, manifestações de movimentos sociais na cidade de São Paulo, inicialmente focadas em protestar contra o aumento das passagens de ônibus (como já havia ocorrido em outras grandes cidades brasileiras) ganharam uma dimensão e uma popularidade não esperada. Os protestos espalharam-se definitivamente por todo o País, levando centenas de milhares de pessoas às ruas noite após noite, e incorporaram outras demandas da sociedade. Deixando de ser “apenas” manifestações de movimentos sociais organizados, como já se via há muito, rapidamente os eventos tornaram-se protestos gerais engrossados pela classe média, exigindo mudanças e reformas por parte do Executivo e do Congresso Nacional.

Fatores de ordem política: na primeira semana de junho, ou seja, antes da explosão dos protestos que tomaram conta das cidades brasileiras, a aprovação da presidente do Brasil já havia caído segundo dados de institutos de pesquisa. Em recente pesquisa feita pelo Instituto Data Folha, ou seja, após a explosão das manifestações, essa popularidade sofreu uma das maiores quedas da história recente, comparável à vivida pelo ex-presidente Collor há 20 anos. O “golpe” parece ainda não ter sido assimilado pelo Governo, mas já é possível ver que há grande estrago na imagem da presidente perante a sociedade brasileira.

E o que isso tem a ver com o programa F-X2? Um leitor menos avisado pode fazer essa pergunta, e nossa resposta é que a relação, apesar de indireta, é muito próxima.

Primeiramente, se a questão econômica antes podia ser considerada uma mera desculpa para diversos adiamentos na decisão do programa (mera desculpa dado que o programa pressupõe financiamento externo de longo prazo, não afetando números da economia no curto prazo), este ano a questão tornou-se bem mais complexa. E nada indica que vá melhorar significativamente, dependendo de certos desdobramentos que deverão ocorrer nos próximos meses para atacar os desafios na economia. Um desses fatores é o câmbio: somente com a desvalorização do real, o custo do F-X2 subiu 10% em pouco mais de um mês.

Em segundo lugar, as manifestações populares cobram mais empenho do Governo em questões básicas do Estado como saúde e educação. Parte da resposta já dada relaciona-se ao aumento dos recursos para estes setores. Mesmo que não exista vínculo entre as verbas necessárias para a aquisição de caças com outros gastos e investimentos governamentais, esse tipo de anúncio costuma ser mal visto perante uma população que pouco entende da importância da Defesa para o País, assim como é pouco informada sobre como funcionam essas compras nos aspectos de financiamentos de longo prazo, participações industriais e benefícios diretos e indiretos.

Se essa visão de “gasto desnecessário” já era um fator a ser colocado na balança pelos decisores finais do F-X2, que dirá após as maiores manifestações de descontentamento popular dos últimos tempos? O volume de gastos com a Copa das Confederações e Copa do Mundo já são objeto de crítica dos protestos (ainda que também sigam processos de financiamento de longo prazo e parcerias com a iniciativa privada). “Nunca antes na história deste País” tanta gente foi protestar, seguidas vezes, contra a falta de qualidade em serviços básicos e contra gastos que considera não prioritários frente a carências históricas.

Por último, com a recente queda acentuada da popularidade da presidente Dilma Rousseff nas pesquisas, é pouco provável que medidas impopulares ou que possuam potencial impopular sejam feitas. Muitas decisões de ordem econômica impopulares provavelmente terão que ocupar o “crédito” que o Governo ainda tenha para esse tipo de decisão. Outras medidas com potencial impopular deverão ser canceladas ou adiadas, e a decisão do programa F-X2 provavelmente estará entre elas. Ora, como as propostas dos três concorrentes ao F-X2 vencem no próximo mês de setembro e, segundo informações dos bastidores, elas não deverão ser renovadas, há uma grande chance do programa F-X2 “morrer” dentro de dois meses.

Lembramos também que faltam seis meses para os caças Mirage 2000 do 1º GDA, baseados em Anápolis, pararem de voar. Esta é uma projeção indicada pelas próprias autoridades de Defesa do país, constando de declarações e presente até no texto do “Livro Branco de Defesa Nacional”.

Há velhos ditados que dizem “rei morto, rei posto”, ou “o rei está morto, vida longa ao rei”. Com uma “morte” repentina do longevo “rei” F-X2, seguida da gradual agonia dos caças atuais da FAB, serão completados mais de 15 anos de uma infrutífera busca por um novo caça para ocupar o trono.

Os caças que atualmente “reinam” no nosso espaço aéreo terão em breve o fim inglório do sucateamento ou de se tornarem monumentos à indecisão, em praças e entradas de bases aéreas pelo país, como vemos nestas imagens de seus outrora gloriosos predecessores. Governos anteriores (e de mais de um partido) já mereceram ganhar a coroa da indecisão quanto aos novos caças, e esta provavelmente continuará a ser ostentada pelo atual. Uma coroa não muito bonita e que, ao invés de ouro, é feita de alumínio amassado e corroído, o principal metal da sucata aeronáutica.

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