Gripen em debate na Suíça: discussões no Conselho Federal e na TV

25

Em novo debate no Conselho Federal, ministro da Defesa da Suíça informa que negociações com suecos estão em andamento – o fato novo no debate é que possível referendo não deverá mais atrelar a compra de caças a economias orçamentárias em outros ministérios

 –

Uma nova rodada de debates ocorreu no Conselho Federal da Suíça na última quinta-feira, 15 de março, relacionada à escolha, no final do ano passado, do caça sueco Gripen para ser o novo caça suíço. O jornal suíço 24 heures informou que no debate o chefe do Departamento de Defesa, Ueli Maurer, novamente defendeu a escolha, reiterando ser um bom avião para a Suíça do ponto de vista da relação custo-desempenho.  A reportagem também trouxe a informação de que as negociações com a fabricante sueca Saab e o governo sueco estão em andamento, de forma a obter os melhor preço e as garantias necessárias.

Por outro lado, os parlamentares estão satisfeitos que, nessa escolha que foi envolvida em muita controvérsia, uma subcomissão de segurança do parlamento está fazendo uma avaliação para lançar luz sobre o processo de avaliação que resultou na escolha do caça sueco. O presidente da subcomissão, Thomas Hurter, disse que um relatório estará pronto na segunda quinzena de maio.

Mas a maior novidade do debate é a possibilidade de um financiamento especial para a aquisição das aeronaves. Até pouco tempo, o Conselho Federal propunha que a compra, que faz parte de um aumento do orçamento das Forças Armadas, estivesse por isso mesmo vinculada a restrições orçamentárias em outros setores, como transporte, pesquisa e educação, o que exigiria um referendo.

Agora o Conselho Federal estuda a possibilidade de um financiamento especial (nota do editor: notícia a respeito disso já fez parte de uma matéria publicada aqui no Poder Aéreo, mas as informações do jornal 24 heures trazem um pouco mais de detalhes sobre as consequências dessa opção), o que agrada aos partidos PDC e UDC, já que isso não traria uma vinculação entre a compra de caças e sacrifícios em outras áreas. E o PS também parece aceitar esse cenário porque, ao final, o povo também teria palavra – de fato, essa opção também estaria sujeita a referendo.

A diferença seria na natureza da questão submetida à votação popular. Ao invés de perguntar: “Você quer um avião de caça em contrapartida a economias em transportes, educação etc?”, a questão seria mais simples: “Você é a favor ou contra a aquisição de aviões de combate?”

O que não se sabe ainda é onde Confederação encontraria os recursos para alimentar um fundo destinado a financiar essa compra. E, segundo o jornal, os parlamentares novamente se concentraram nos elementos técnicos da questão e não responderam à questão de fundo do debate: a Suíça precisa de um novo avião de caça?* Os F/A-18 em serviço, e que foram modernizados recentemente, não podem cumprir sozinhos a função de policiamento aéreo?

 

Mas onde o debate esquentou mesmo foi na TV suíça, no programa “Arena”

O site da SFTV suíça divulgou na sexta-feira, 16 de março, vários vídeos com o debate que ocorreu no programa “Arena”, onde estavam presentes o chefe do Departamento de Defesa, Ueli Maurer, o comandante da Força Aérea Suíça, Markus Gygax, e parlamentares. Juntamente com os vídeos, o site publicou também trechos transcritos, onde dá para perceber que o debate esquentou em alguns momentos. Uma coisa parece certa: a maioria dos políticos é a favor de um referendo. E, numa rápida votação envolvendo a audiência do programa, o “sim” para a compra do Gripen venceu por uma pequena margem.

No programa, o chefe do Departamento de Defesa disse que a avaliação foi feita com muito cuidado, que o caça escolhido se encaixa nas necessidades das Forças Armadas Suíças, que é acessível e o melhor modelo para o país, tendo passado por todos os testes e cumprido todos os requerimentos.

A Conselheira Nacional Chantal Galladé disse que “o Gripen é um avião de papel. Nenhum piloto suíço já voou nele, há apenas modelos. Além disso, há os F/A-18 que foram modernizados. É o bastante!”

Pelo que se pode compreender da transcrição dos debates, o chefe do Departamento de Defesa contra-argumentou que o Gripen não é um avião de papel, e sim a evolução de uma aeronave já existente. Todos os equipamentos que serão instalados já foram testados, “nós apenas teremos que colocá-los juntos”. Por fim, argumentou que a Suíça terá, quando da entrega dos jatos, a mais moderna tecnologia.

De acordo com o comandante da Força Aérea Suíça, Markus Gygax, dos três caças que concorreram, o Gripen era o modelo de menor desempenho (em alemão, schwächste, que também pode ser traduzido como “mais fraco”) : “O Gripen é a menor aeronave, a mais leve e tem apenas um motor. Mas, para nossas necessidades, é suficiente.” Gygax afirmou que o Gripen cumpre os requerimentos suíços.

A Conselheira Nacional Corina Eichenberger-Walther, é a favor do Gripen, e afirmou que ele se encaixaperfeitamente para a renovação da força aérea. Ela disse, porém que há inconsistências a serem esclarecidas, e que os riscos em custos deveriam ser limitados num valor aproximado, o que reforça a importância de um contrato que seja muito bem escrito.

Para isso, foi estabelecido um subcomitê de defesa, disse Galladé, e ele deverá solucionar os problemas destacados, com o que concordou Corina Eichenberger-Walther – a questão principal será como lidar com as entregas e o financiamento.

Os convidados do programa solicitaram que se dê transparência aos relatórios sobre o Gripen. Ueli Maurer disse que isso é impossível, e que há acordos de confidencialidade que devem ser mantidos. A Suíça se comprometeu a não publicá-los. A sua decisão foi baseada no julgamento de especialistas que lidaram com os relatórios. Maurer fez uma comparação: “É como se as pessoas ficassem discutindo, como se fossem cirurgiões cardiologistas, como fazer uma cirurgia no coração.”

O que políticos de esquerda vem criticado é a falta de ameaças militares que justifiquem a compra. Maurer disse que essa falta de ameaças foi levada em conta: “Cinquenta e quatro jatos mais velhos serão desativados. Vinte e dois novos virão”. Então aproximadamente metade da frota será cortada. Além disso, as Forças Armadas Suíças já chegaram a ter 400 aeronaves. Se o nível de ameaça muda, o país tem que ser capaz de responder imediatamente: “Nós não podemos ter como garantido o que irá acontecer nos próximos 30 anos. Isso seria negligência.”

Apesar disso, segundo a SFTV, os caças custarão 3,1 bilhões de francos, dinheiro que a Suíça não tem à disposição. O Parlamento quer economizar em outros departamentos, como educação, o que provoca críticas da esquerda. Maurer afirmou que a soma representa apenas 1% de todos os gastos, e que “qualquer empresa iria dar risada sobre 1%”, mas no nível federal, as coisas são um pouco mais complicadas. Galladé argumentou que o dinheiro vai precisar, de qualquer forma, vir de algum lugar, “educação, transporte público, agricultura ou política externa.”

De qualquer forma, os políticos da esquerda até a direita esperam que a decisão venha por meio de um referendo, e Corina Eichenberger-Walther gostaria de um como o de 1991, quando o povo decidiu a compra dos F/A-18. O Conselheiro Rino Roland Büchel também é a favor de um referendo, e Ueli Maurer também afirmou que não tem nada contra: “Eu apreciaria uma votação. Estou convencido que as pessoas votariam sim.” Uma pesquisa na audiência do “Arena” terminou com um “sim” para o Gripen, por uma pequena maioria.

FONTES: 24 heures e SFTV (tradução, adaptação e edição: Poder Aéreo)

IMAGENS: Saab, SFTV (clique no link para acessar página com os vídeos, em alemão) e Força Aérea Suíça

*NOTA DO EDITOR 1: para essa questão da necessidade de um novo caça, a Armasuisse (organização responsável pela aquisição de equipamento militar) divulgou documentos em que essa necessidade é justificada. O Poder Aéreo traduziu e resumiu os argumentos dessa documentação, e publicou uma matéria especial a respeito, que pode ser acessada no primeiro link da lista a seguir. As respostas do chefe do Departamento de Defesa Ueli Maurer no programa de TV, referido na matéria acima, também seguem na mesma linha dos argumentos (a favor de novos caças) da Armasuisse, que trouxemos para os leitores.

NOTA DO EDITOR 2: já imaginaram um programa de TV no Brasil, com plateia, participação e votação dos ouvintes, presença de parlamentares, do Ministro da Defesa e do Comandante da Força Aérea, em que fosse discutida a aquisição da caças para a FAB? Uma boa coisa para se refletir neste domingo, enquanto se pula de um canal para outro nos  intervalos dos tradicionais programas de auditório e jogos de futebol…

VEJA TAMBÉM:

wpDiscuz