Calma!!! O ‘Poder Aéreo’ criticado pelo articulista de um jornal indiano e pelo historiador que lhe serve de fonte não é o nosso site, mas sim os limites para a aplicação do Poder Aéreo nos conflitos. O título original é ‘No shock and awe left in the air’ – ‘Nenhum choque e pavor resta no ar’.

O jornal India Today publicou neste domingo uma interessante reflexão sobre os limites do Poder Aéreo, escrita pelo articulista Manoj Josh e baseada em pesquisas do historiador militar Martin Van Creveld, tudo isso no contexto do contrato da aquisição de 126 novas aeronaves de combate pela Índia (programa  MMRCA). Você pode concordar ou discordar dos argumentos deste texto traduzido pelo Poder Aéreo, mas vale a pena refletir sobre eles. Boa leitura!

Em semanas, a Índia deverá tomar uma decisão para a compra de 126 aviões de combate multitarefa de porte médio (MMRCA). A aprovação inicial falava de um contrato de 8,52 bilhões de dólares, mas as estimativas mais recentes, levando em conta que as aeronaves serão ou o Eurofighter ou o Rafale, falam no dobro dessa quantia. E caso a rúpia se comporte como vem acontecendo, a soma poderia ser até maior.

O MMRCA será o principal caça de linha de frente da Índia por apenas dois anos, quando se espera que será suplantado pelo caça russo de quinta geração – o qual a Índia também planeja adquirir em quantidade. Se o país pode se dar ao luxo de ter o que facilmente será, por volta de 2020, uma das mais poderosas forças aéreas do mundo, já é uma outra questão.

E se levarmos em conta o que diz Martin Van Creveld, um dos mais importantes historiadores militares do mundo, poderemos estar apenas jogando fora um bom dinheiro.  Num estudo original e competente, ele argumenta que o Poder Aéreo nunca correspondeu ao que propagandearam seus defensores, que foram levados pela imagem de homens voando soberbas máquinas de guerra voadoras.

Ao invés de se deixar levar pela visão maravilhosa e tecnológica de máquinas aéreas, Van Creveld mediu a efetividade do Poder Aéreo em relação a outros poderes lançados contra um adversário, assim como onde ele realmente faz a diferença. Ironicamente, o principal foco de arrogância em relação ao Poder Aéreo são os Estados Unidos, cuja força aérea é, de longe, a mais poderosa do mundo. Em 2002 os EUA  passaram por cima do Iraque com a doutrina “shock and awe” (choque e pavor) de sua força aérea. As forças de Saddam Hussein foram varridas, mas um outro adversário foi liberado: a guerrilha, que nunca foi muito vulnerável ao Poder Aéreo.

O problema –  que Van Creveld demonstra por meio de uma pesquisa que começa com aviadores italianos jogando granadas de mão sobre guerrilheiros líbios em 1911, e termina com a guerra em andamento no Afeganistão – é que o Poder Aéreo é “entregue” ao adversário ou em carência ou em excesso. Ou é de menos, ou é demais.

É carente quando falha em interditar as linhas de suprimento norte-vietnamitas na década de 1960, ou em reprimir os talibãs com veículos aéreos e vigilância 24 horas no Afeganistão. E é claramente excessivo quando tira do mapa cidades inteiras, como foram os casos de Hiroshima e Nagasaki naquele fatídico mês de agosto de 1945.

Van Creveld não diz que o Poder Aéreo nunca foi efetivo. O ponto é que, numa perspectiva histórica, seu pico já foi atingido na Segunda Guerra Mundial. O autor destaca que  “nenhuma operação militar de larga escala que não tivesse a devida cobertura aérea tinha alguma chance de sucesso.” Com a disseminação de armas nucleares, a ameaça derradeira de destruição total trazida pelo poder Aéreo tornou-se em si um absurdo, porque criou uma situação em que tanto o atacante quanto o atacado poderiam ser destruídos.

A questão de lutar as guerras atuais é de outro tipo. O crescimento da mídia global tornou um tabu os ataques contra cidades e civis. Apesar da altíssima precisão de mísseis lançados de veículos aéreos não tripulados, ainda há baixas civis.

De acordo com dados dos Estados Unidos, desde 2006 foram mortos 2.157 líderes e quadros do Talibã e da Al Qaeda, por meio de ataques de drones (aeronaves não tripuladas) nas regiões tribais do Paquistão, contra uma cifra de apenas 138 civis. Mas, como qualquer pessoa familiarizada com o problema já sabe, tem sido enorme o valor propagandístico que os Talibãs tiram dessas mortes “colaterais”. O fato é que não existe uma coisa chamada ataque cirúrgico, especialmente quando se trata de ambientes asiáticos superpovoados.

A Força Aérea Indiana pode continuar crescendo e adquirindo caças de primeiríssima linha, na medida em que o orçamento do país seja um saco sem fundo. Mas, segundo Van Creveld, outras forças aéreas estão em declínio.  Peguemos como exemplo o caça norte-americano F-22, considerado o melhor do mundo (apesar de recentemente proibido de voar por uma pequena falha embaraçosa). O plano original dos Estados Unidos era de adquirir 750 aeronaves, mas a quantidade foi inicialmente reduzida para 648 e então, sucessivamente, para 442, 339 e 277. Isso até o antecessor do atual secretário de Defesa dos EUA decidir terminar o programa com 187 caças.

O Eurofighter também vem trilhando o mesmo caminho, especialmente agora, quando as economias europeias precisam se retrair.

O problema não é que as aeronaves sejam ruins – elas são de primeira linha – mas se os gastos envolvidos em comprá-las e mantê-las serão proporcionais ou não ao tipo de missão em que estarão envolvidas.

No fim das contas, há uma real necessidade de líderes que pesem suas demandas e seus orçamentos, e que também permaneçam focados nos resultados. Os exércitos, como defende Van Creveld, ainda são necessários para conquistar e pacificar territórios inimigos. E as marinhas continuam sendo os melhores meios de levar grandes cargas por longas distâncias e projetar poder ao redor do mundo.

FONTE: India Today (tradução, adaptação e edição: Poder Aéreo)

NOTA DO EDITOR: disponibilizamos aqui alguns links para resenhas e opiniões (em inglês) sobre o livro de Martin Van Creveld, algumas concordando e outras discordando dos argumentos e conclusões da obra “The Age of  Airpower”, lançada no início deste ano:

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