Depois do fim da Copa e das Olimpíadas, 2017 será o começo do fim da FAB?

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F-X2: um programa com a faca, o queijo e o pires na mão

 

Este é um longo editorial para combinar com uma longa espera por novos caças. Em 2014, assistiremos à Final da Copa Mundo, que será no Brasil (mas não necessariamente com o Brasil). Em 2016, a maratona marcará o fim das Olimpíadas do Rio de Janeiro. E, em 2017, a baixa dos primeiros F-5M da FAB poderá marcar o começo do fim da nossa aviação de caça, se os eternos programas de aquisição de novas aeronaves continuarem sem decisão.

Reportagem da Aviation Week mostrada ontem no Poder Aéreo (clique aqui para acessar) trouxe a confirmação de uma informação que há muito circulava neste site e em diversos meios, sobre o prazo de desativação dos primeiros caças F-5M da FAB. O tenente brigadeiro do ar Gilberto Antonio Saboya Burnier, comandante do COMGAR (Comando Geral de Operações Aéreas), afirmou que em 2017 os primeiros F-5M deverão ser desativados.

Nas últimas semanas, nossos leitores puderam ver como andam os trabalhos para manter e eventualmente ampliar a frota de F-5M da FAB, notadamente com os três modelos bipostos adquiridos junto à Jordânia e que, após o término de suas inspeções no Parque de Material Aeronáutico de São Paulo (PAMA-SP), deverão seguir para modernização na Embraer (clique aqui para acessar matéria com links para toda a série). É de se esperar que os oito monopostos “ex-jordanianos” sigam o mesmo caminho dos bipostos, uma vez que o contrato de modernização já publicado no DOU inclui estas células.

Mas, levando-se em consideração os pouco mais de cinco anos que nos separam de 2017, pode-se conjecturar que a entrada em operação desses onze (caso ocorra tudo bem nos processos de revisão e modernização) praticamente sirva para compensar a baixa de outros tantos caças. Assim, ao invés de uma ampliação, praticamente deverá ser mantido o total de 46 aeronaves do tipo, pouco mais, pouco menos, conforme o desgaste das aeronaves mais voadas da frota (que ao menos contará com um ligeiro aumento na proporção de bipostos).

Já se especulou que esses onze F-5, logo que modernizados, poderiam substituir os F-2000 (Mirage 2000C) do 1º GDA (esquadrão Jaguar), o que até fazia sentido. Mas, para estes últimos, uma recente aquisição de peças deverá garantir a operação somente até 2013, aparentemente não mais do que isso. Ou seja, os dois anos que temos pela frente são um prazo um tanto curto para a modernização de todos os onze F-5 ex-Jordânia que estão no PAMA-SP, levando em conta que oito deles (os monopostos) mal iniciaram os trabalhos de inspeções e reparos. Além disso, deve-se levar em conta não só a perspectiva de baixa dos primeiros F-5M alguns anos depois, em 2017, mas o fato da frota do tipo já ser reduzida hoje.

O impacto só não é maior porque cortes orçamentários levaram a uma redução drástica nas horas de voo, culminando na decisão de encostar aproximadamente 1/3 dessa frota, para também não gerar gastos de manutenção, conforme informações de fontes da FAB. Ou seja, o problema da falta de caças só não é maior devido a um outro problema, o da falta de recursos, que afeta a própria manutenção da capacidade dos nossos pilotos!

Em março deste ano, fizemos algumas contas para mostrar o impacto de uma possível desativação prematura dos F-2000 do esquadrão Jaguar (clique aqui para ver matéria da época), onde colocamos “a nu” a situação da frota de F-5M. Ontem, as palavras do brigadeiro Burnier na reportagem da Aviation Week ajudaram a tirar mais algumas peças de roupa dessa situação, mas vale a pena atualizar as contas.

Para entender como a frota atual é pequena (descontada a questão das aeronaves encostadas devido à absurda redução nas horas de voo deste ano), basta subtrair desse número de 46 caças F-5M os cinco que eram vistos em revisão no PAMA-SP em outubro deste ano, e mais um que normalmente é alocado para missões de testes de armas e sistemas. Sobram 40, a serem divididos entre quatro esquadrões: os dois do 1º Grupo de Aviação de Caça, de Santa Cruz (que operam suas aeronaves em “pool” nos esquadrões Jambock e Pif-Paf) o 1º/14º Grupo de Aviação (esquadrão Pampa), de Canoas e o 1º/4º Grupo de Aviação (esquadrão Pacau), de Manaus. Dividida a frota realmente operacional de F-5M por quatro esquadrões, chega-se a apenas 10 aeronaves por esquadrão, das quais, a qualquer momento, uma porcentagem estará sofrendo manutenção / inspeções periódicas e rotineiras em suas bases. Isso dá menos que o “mínimo” de doze caças que se costuma aceitar em várias forças aéreas dignas desse nome.

Na verdade, o 1º/4º GAV opera uma quantidade bem menor de aeronaves do que isso, por ter feito apenas recentemente a transição para o F-5M e estar aguardando melhorias em sua base para permitir o aumento de sua dotação – o que deixa sobrar um pouco mais para os outros três esquadrões. Mas essa situação do Pacau é algo que não faz sentido manter por muito tempo, ainda mais numa região, como a Amazônia, onde o frequente desdobramento em frações é uma doutrina necessária em uma área tão grande (levando-se em conta também o alcance relativamente curto do F-5). O que já seria difícil de se fazer com meras 10 aeronaves por esquadrão, fica ainda mais complicado com apenas metade desse número, que é a situação atual do esquadrão! Mais cedo ou mais tarde, o Pacau precisará ser reforçado para justificar sua própria existência e emprego naquela região.

Mas enfim, onde queremos chegar com essas contas? A uma outra contagem, a regressiva

Em todo o Brasil, diversas notícias da mídia em geral tratam do muito que falta a fazer e do prazo cada vez mais exíguo para a preparação de dois grandes eventos: a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Mas o relógio também corre (e há muito mais tempo) para a desativação dos caças supersônicos da FAB. Os primeiros a dar baixa deverão ser os F-2000, já em 2013. Os F-5M iniciarão a saída do serviço em 2017, conforme as informações divulgadas, e provavelmente os últimos a passar por modernização sejam utilizados por mais algum tempo, avançando na próxima década e permitindo uma desativação gradual. Sem nenhuma nova aquisição de caças, em meados da década de 2020 restarão, provavelmente, 43 jatos de ataque subsônicos A-1 modernizados (processo apenas iniciado) compondo a primeira linha da FAB.

Percebe-se que em 2014 já seriam necessários novos caças supersônicos. Como mostramos acima, a possibilidade de termos F-5M “ex-jordanianos” prontos a tempo para a tarefa, e em quantidade, é remota. A imagem abaixo, à esquerda, mostra o estado atual do F-5E (monoposto) “ex-Jordânia” que aparentemente lidera a fila dos que serão inspecionados e reparados antes de seguir para modernização. E a imagem da direita mostra alguns que estão mais para o fim da fila.

O ideal seria que o programa F-X2 já tivesse sido decidido – mas infelizmente não foi – para que um primeiro lote de no mínimo 12 aeronaves novas substituísse os F-2000 em 2014 e um segundo lote de 12 tomasse o lugar dos primeiros F-5M desativados, por volta de 2017. Mas, ao invés de um ideal de 2/3 do total de 36 aeronaves previstas no F-X2 entregues já em 2017, o que teremos (com muita fé…) é o início de entregas naquela data.

Qual a solução óbvia para o problema, caso se decida por algo além dos eternos adiamentos? Provavelmente vem aí mais um “caça tampão”, como foi o caso dos F-2000. Mas, com a perspectiva de operação em maior escala de caças de quinta geração a partir da próxima década, os próprios caças novos de geração 4,5 do F-X2 já podem ser considerados “caças tampão” – aviões de grande utilidade para cobrir uma lacuna atual e para, no longo prazo, serem parte importante de uma frota ou “mix”, mas não sua ponta de lança. O que dizer então da efetividade, nas próximas décadas caças usados e em fim de linha, como foi o caso dos F-2000 anos atrás? Seriam, no máximo, “tampões de futuros tampões”, aguardando pela chegada de eternos substitutos menos velhos. Ou alguém imagina que cobririam a lacuna até um caça de quinta geração para a FAB? Afinal, levando-se em conta os lamentáveis históricos dos nossos programas de quarta geração (F-X1 e F-X2) que se poderia esperar de um F-X3?

É certo que o cenário da América do Sul não é o mesmo de outras regiões mais conflituosas do planeta, onde a entrada em operação de aeronaves de nova geração é aguardada com ansiedade, e decisões são tomadas hoje para esse fim. Mas a perspectiva do Brasil é ter uma Força Aérea cada vez mais distante da tecnologia de ponta em caças supersônicos?  Não é isso que está nos grandes planos e estratégias tão pomposamente divulgados, e que na prática deveriam servir como ponto de partida para decisões, e não como desculpas para postergá-las.

O ideal otimista (para quem conseguir manter o otimismo após ler os parágrafos acima) seria que, independentemente de um eventual vencedor do F-X2, o seu fabricante pudesse ao menos entregar versões novas ou usadas de seus caças a tempo de cobrir a baixa dos F-2000. E isso sem perder de vista a necessidade de novas entregas em 2017, dentro das expectativas do programa para transferência de tecnologia e de produção local – o que, dado o prazo e a quantidade necessárias, a cada dia que passa torna-se mais difícil de se cumprir. Muito poderia ser feito para se extrair o máximo dos concorrentes do F-X2, numa época de crise mundial que coloca a faca e o queijo nas mãos dos compradores. Mas, com  os prazos de renovação dos caças da FAB tornando-se insustentáveis, ao invés da faca e do queijo acabaremos ficando é com o pires na mão.

Sejamos francos: o prazo para o F-X2 ser concretizado, conforme planejado originariamente, já caducou. E faz tempo. Talvez com alguns remendos e concessões o programa, que passou do “timing” ideal para diversas de suas necessidades de transferência de tecnologia e desenvolvimento conjunto, ainda possa cumprir ao menos parte dessas expectativas originais, ao mesmo tempo em que possa atender às urgentes demandas da FAB. Ou uma dessas variáveis vai estragar o equilíbrio ideal entre as necessidades tecnológicas e as urgências operacionais. Isso, é claro, se alguma decisão for tomada em algum dia do ano que vem.

Até lá, resta torcer. Por quem? Pela Índia, Suíça, Japão, Coreia, Emirados. Mas me ajudem a lembrar, eles estão na Copa?

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