Nem Rafale nem Typhoon: articulista indiano defende F-35 no lugar do MMRCA

12

‘Acabem com esse hara-kiri do MMRCA’, diz o título de artigo de Ajai Shukla publicado no jornal Business Standard

Anteontem, publicamos aqui a tradução de uma matéria de um jornal inglês, defendendo a tese de que o Typhoon lidera o programa MMRCA. Ontem, foi a vez de um artigo de site indiano de defesa, dizendo que quem está na liderança é o Rafale. Para acessá-las, veja os links ao final desta matéria. Agora, é a vez de mostrar uma terceira e polêmica opinião: para o articulista Ajai Shukla do jornal Business Standard, a Força Aérea Indiana deveria, de maneira franca, dizer ao Ministério da Defesa da Índia que a defesa nacional demanda acabar com o programa MMRCA. Ele considera o custo do MMRCA acima do aceitável e sugere a compra do F-35 por meio de um contrato de único fornecedor. Veja abaixo a tradução do Poder Aéreo deste artigo publicado na terça-feira, 1º de novembro:

Na próxima sexta-feira, quando os altos executivos do consórcio Eurofighter GmbH e da Dassault se encontrarem no escritório de Vivek Rae, diretor geral de aquisições do Ministério da Defesa Indiano, é certo que a tensão estará elevadíssima. Qual o objetivo da reunião? A abertura das propostas comerciais para a maior compra internacional de armas, que também é a mais mal-concebida do mundo. Falo da inconsequente proposta da Força Aérea Indiana (IAF) para comprar 126 aviões de combate multitarefa de porte médio (MMRCA) que estarão superados, em desempenho e armamentos, por caças chineses logo após entrarem em serviço na IAF.

A abertura das propostas, em qualquer grande contrato, é um momento de tensão. A enorme ansiedade do consórcio Eurofighter e da Dassault também deriva do fato de que a compra da IAF é crucial para o futuro de qualquer um deles.

O grupo Eurofighter está enfrentando graves problemas internos, com as nações parceiras diminuindo os seus pedidos. A Índia é desesperadamente importante para a restauração do equilíbrio econômico da produção do Typhoon. A RAF já diminuiu suas encomendas do caça e, na semana passada, o jornal The New York Times noticiou que a Força Aérea Alemã (que ironicamente lidera a campanha do Typhoon na Índia) está fazendo ajustes nas suas compras, o que diminuirá de 177 para 140 o número de Typhoons que vai adquirir.

A Dassault está num aperto ainda mais terrível, já que o Rafale falhou em encontrar qualquer cliente internacional. Há encomendas para apenas 180 caças Rafale, todos para as Forças Armadas Francesas, que dificilmente teriam outra opção de compra.

No início da reunião de sexta-feira, o único sujeito mais despreocupado deverá ser o próprio sr. Rae, que estará sentado sobre o cofre de  Rs 42.000 crore do Ministério da Defesa. Mas seu bom estado de espírito não deverá sobreviver à abertura das ofertas, porque as estimativas de custo, levantadas pelo Ministério há uns seis anos, muito provavelmente serão superadas pela oferta de menor valor. No mês passado, o Ministério reavaliou sua estimativa original num processo chamado de “benchmarking” (aferição, ou comparação com referencial). Mas o sr. Rae sabe que, no caso do valor cotado pelo vencedor ser significativamente superior à estimativa de referência do Ministério, o processo terá que ser reiniciado.

Se algo do gênero ocorrer, seria uma benção disfarçada. E seria também a melhor maneira de se livrar desta compra, que não faz sentido algum. Isso porque são caças com preço exorbitante e que sofrerão grandes perdas no caso de um conflito com a China. Tanto o Typhoon quanto o Rafale são caças da “4ª geração plus”, inferiores em aspectos fundamentais ao J-20, o caça furtivo chinês de “5ª geração” que voou pela primeira vez neste ano. Obviamente, o J-20 precisará de uma década de testes de voo antes de entrar em serviço operacional, mas o primeiro MMRCA seria entregue à Força Aérea Indiana apenas por volta de 2015-16. Cinco anos depois, caças J-20 operacionais da PLAAF (People’s Liberation Army Air Force – Força Aérea do Exército de Libertação Popular) estarão no domínio dos Himalaias. E os MMRCAs da IAF, já ultrapassados em 2020, continuarão “manquitolando” pelos céus até 2050, já que o Ministério da Defesa deverá, com razão, alegar que gastou entre Rs 42.000 e Rs 84.000 crore neles.

Infelizmente, a IAF está fechando seus olhos a este problema, mesmo com o crescimento do perfil aeroespacial da China servindo como referencial para outras forças aéreas regionais. O Japão, a Coreia do Sul e Cingapura estão percebendo que uma frota de caças de quinta geração é necessária para oferecer uma capacidade real de defesa frente à PLAAF. A Coreia do Sul está perto de selecionar o F-35 Lightning II da Lockheed Martin, o único caça de 5ª geração oferecido no mercado mundial. A Força Aérea de Auto Defesa do Japão (Japan Air Self Defence Force – JASDF) também está se inclinando para o F-35, depois que a Lockheed Martin foi proibida de exportar o F-22 –  sem dúvida o mais avançado caça do mundo – para o Japão. Em 2003, Cingapura investiu recursos no programa de desenvolvimento do F-35, e está no caminho de comprar a aeronave.

Dado que não é necessário ser muito inteligente para perceber que a ascenção chinesa impõe a adquisição de um caça de quinta geração, então por que a IAF (presumivelmente um personagem racional) está inexplicavelmente comprando caças da “quarta geração plus”? A triste resposta está no estrangulamento político e burocrático em relação a aquisições, pelo qual toda reavaliação da IAF traz consigo, como castigo, anos de atraso. No início da década passada (anos 2000), quando a IAF formatou o processo de compra do MMRCA, não havia nenhum caça de quinta geração à venda. O F-35 já vinha sendo desenvolvido, mas ainda não estava pronto para testes de voo, o que era um elemento fundamental no processo de aquisição indiano. Incapaz de esperar por um caça de quinta geração, a IAF diminuiu seus requisitos e iniciou uma disputa imparcial envolvendo vários competidores, oferecendo quaisquer caças de “quarta geração plus” disponíveis no mercado.

Anos depois, quando a IAF se encontra na posição de escolher entre dois caças dessa “quarta geração plus”, deve-se destacar que o F-35 está às vésperas de sua liberação para operações. Seu fabricante, a Lockheed Martin, já sinalizou de várias formas que poderia fornecer esse caça à IAF, a um custo básico (fly-away – pronto para voar) de 65 milhões de dólares por aeronave (significativamente mais barato que o Rafale ou o Typhoon), iniciando as entregas em 2015. O Governo dos Estados Unidos já indicou que qualquer venda de F-35 à Índia seria liberada com presteza. Mas, para uma insegura IAF, acostumada a ser tratada com rispidez pelo Ministério da Defesa, um pássaro na mão é melhor do que dois no arbusto. A compra do MMRCA possibilitaria a formação de seis esquadrões de caças razoavelmente bons, ainda que superados pela PLAAF no caso de uma guerra. Qualquer mudança nesse estado de coisas, ao menos segundo as expectativas da IAF, necessitaria de novas autorizações do Ministério, assim como acarretaria sanções financeiras, o que custaria mais três anos.

Mas há uma alternativa. A IAF deveria dizer francamente ao Ministério da Defesa que a situação mudou, e que a segurança nacional impõe o cancelamento do programa MMRCA, que está com sobrepreço, e a compra do F-35 por meio de um contrato de ofertante único (single-vendor contract). A defesa pátria não pode ficar refém dos requisitos processuais de uma disputa envolvendo múltiplos competidores. Além disso, o pagamento acima das estimativas não é justificável já que se trata de uma competição. A Índia, recentemente, adquiriu várias aeronaves muito boas de ofertantes únicos, em acordos governo-a-governo: o Sukhoi-30MKI da Rússia e os aviões de transporte C-130J e C-17 dos Estados Unidos. A aquisição de um novo caça que formará a espinha dorsal da IAF por décadas deve ser tratada com a mesma urgência.

FONTE: Business Standard (tradução, adaptação e edição: Poder Aéreo)

FOTOS: jsf.mil, Dassault e Eurofighter

NOTA DO EDITOR: o articulista defende pontos de vista muito interessantes e extremamente válidos. Com o respeito às devidas proporções, os argumentos podem gerar uma discussão interessante também sobre o nosso F-X2 (com a diferença que a Índia já possui caças de 4ª geração em quantidade, como o Su-30, e o Brasil não, sem falar que as demandas de defesa dos dois países também são muito diferentes).

Porém, no que se refere ao caso indiano, em nenhum momento Ajai Shukla menciona a participação de seu país no programa do caça furtivo russo PAK-FA, uma aeronave de quinta geração que está na categoria de caça pesado, compatível com o porte do J-20 chinês e com o emprego que se espera do mesmo. Afinal, na provável época em que o J-20 chinês entrar em operação, a Índia  também já deverá possuir suas primeiras unidades da versão local do PAK-FA. Ou será que não?

VEJA TAMBÉM:

wpDiscuz