Após relatório, colegas não entendem atos de pilotos do AF 447

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Um clima de tabu ronda os profissionais da Air France desde a divulgação do relatório preliminar sobre a sequência de acontecimentos que culminaram na queda do voo AF 447, publicado pelo BEA (Escritório de Investigações e Análises) na sexta-feira. Desde então, reclamando que os dados revelados são incompletos, poucos pilotos aceitam falar com a imprensa, e os que rompem o silêncio, pedem sigilo.

“Por não suportar a pressão da mídia e das famílias, o BEA selecionou alguns elementos e os publicou. Mas sem a contextualização necessária, fica impossível de interpretar o que aconteceu”, afirma um piloto da Air France ligado ao sindicato da companhia.

Para ele, o relatório apenas aumentou as especulações em torno do acidente e foi direcionado para suscitar dúvidas sobre a competência dos pilotos. “Não sabemos direito o que eles enxergavam no painel. Por exemplo, para mim, parece totalmente plausível que um piloto tivesse uma informação no lado direito, e o outro estivesse diante de dados totalmente opostos, de acordo com o que foi revelado”, garante.

Uma das informações mais incoerentes divulgadas pelo BEA, conforme este piloto, diz respeito às asas traseiras do avião: elas deveriam estar inclinadas em 3 graus, mas estavam em 13 graus. “Isso é inexplicável em um voo dito ‘normal’, e pode ter sido um fator que dificultou muito a retomada da sustentação do avião”, disse.

Essa hipótese também é levantada por Gérard Arnoux, ex-piloto da Air France e consultor em segurança aeronáutica. Cético em relação à independência do BEA, Arnoux não descarta que uma pane generalizada tenha ocorrido no Airbus A330, acidentado no meio do caminho entre o Rio de Janeiro e Paris, há exatos dois anos. “O bloqueio do plano horizontal traseiro pode fazer com que o avião caia imediatamente e ele não possa mais ser recuperado. Pelos poucos diálogos divulgados, nós percebemos que a tripulação tentou retomar o controle da aeronave, mas não conseguiu”, explica.

Outro ponto nebuloso sobre a conduta dos pilotos dos do AF 447, lembra Arnoux, é que o BEA não indicou em que velocidade voava o avião no momento em que os pilotos decidiram elevar o nariz do aparelho para cima – uma das atitudes que diversos especialistas questionaram desde que o relatório foi publicado e que o próprio diretor do BEA, Jean-Paul Troadec, disse não compreender. “Se o painel indicava uma velocidade de 1000 km/h, é óbvio que a reação do piloto deveria ser empinar o avião para tentar reduzi-la”, analisa.

“Os erros na velocidade, provocados pelo congelamento das sondas pitots, foram cruciais para determinar as reações do Airbus – que é todo automático – e, por consequência, as atitudes dos pilotos”, argumenta outro comandante, que pediu anonimato. “Nós somos treinados para lidar com panes, mas não com defeitos de fabricação. E este defeito era conhecido da Airbus e da Air France”, reclama um terceiro piloto, que também não quis ser identificado. O próprio BEA subestimou a gravidade da falha das sondas pitot: em um relatório que integra a investigação judicial do acidente – resultante de análises distintas e independentes do BEA -, especialistas verificaram que, em 2008, o BEA fora informado sobre os recorrentes incidentes com as sondas de velocidade em Airbus. Na época, o órgão avaliou que a disfunção “não era capaz de provocar incidentes graves que colocassem em dúvida a segurança do voo”.

Embora desconversem sobre a possível falta de treinamento dos pilotos para lidar com o problema – apontada pelo mesmo relatório judicial -, os comandantes ouvidos pelo Terra são categóricos sobre as falhas das sondas: para todos, o acidente não teria ocorrido se as sondas tivessem funcionado normalmente naquela noite de 31 de maio de 2009.

“Agora, todos estão perfeitamente informados sobre o que devem fazer caso aconteça um imprevisto como aquele”, diz um piloto. “Mas isso não muda o cenário de que, naquela época, não existia essa certeza sobre o que fazer”, concluiu.

FONTE: Terra

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