F-X2: uma visão europeia sobre o assunto

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O artigo a seguir foi publicado pelo site português Área Militar em 28 de novembro passado e representa uma visão externa do processo de escolha do novo caça da FAB. O Poder Aéreo não concorda nem discorda (muito pelo contrário) da opinião apresentada.

TÍTULO ORIGINAL

Programa FX: Lula manda calar a FAB

Rafale é escolhido contra qualquer argumentação

O presidente da República, Luís Inácio da Silva, através de seu ministro da defesa, determinou que a Força Aérea Brasileira não apresentasse um favorito em seu relatório de análise que faz parte do processo de aquisição de caças para a força aérea brasileira, conhecido como programa FX (ou F-X2).

A ordem teve como objetivo evitar o mal-estar entre o governo e a força aérea, por causa das opções políticas tomadas pelo governo Lula, que levaram à escolha do caça francês, contra qualquer análise técnica que possa ser apresentada pela Força Aérea.

A determinação presidencial é vista por setores próximos da FAB como no mínimo estranha, já que a razão para apresentar um relatório, era a de justificar a compra de um equipamento caríssimo que servirá o país durante muitos anos. «Se é pra não saber qual a opção da FAB, pra quê um relatório extenso com 25.000 páginas de estudos técnicos ?» perguntam.

Transferência de tecnologia

O presidente brasileiro ficou impressionado com as promessas políticas do presidente da França durante sua visita ao Brasil, para participar nas cerimônias do 7 de Setembro. Lula ficou especialmente impressionado com a garantia dada por Sarkozy, de que a França podia transferir toda a tecnologia de fabricação de seu caça Rafale.

Muito bem recebidas por Lula da Silva, as declarações de Sarkozy levaram parte da industria francesa e dos sindicatos do país a entrar em pânico.
A afirmação de Sarkozy sobre a transferência de tecnologia teve que ser explicada na Europa, mas a informação aparentemente não chegou ao Brasil, onde continua a passar na imprensa a ideia de que o país poderá fabricar o Rafale.
Os franceses explicaram para sua opinião pública, que não é necessário transferir grande parte da tecnologia, pois o Brasil já possui uma indústria aeronáutica e aeroespacial, que concorre em todo o mundo, e que poderia ocorrer transferência de tecnologia em casos pontuais onde o Brasil precisasse dela.

O problema para a FAB, na questão da transferência de tecnologia, é a enorme diferença entre as afirmações políticas de Sarkozy, e o que a indústria francesa «de fato» tem disponível para ceder ao Brasil. Até ao momento não há nada de claro sobre transferência de tecnologia, Lula não faz a mínima ideia de que tecnologias podem ser transferidas, Jobim também não e Sarkozy não tem ideia nenhuma sobre o que prometeu ao presidente brasileiro.
Tudo não passou de um aperto de mão entre cavalheiros.
O brasileiro não sabia o que lhe estava sendo oferecido.
O francês não tinha a mínima ideia se podia oferecer o que não lhe pertencia.

Promessa de boca, não vale nada

O «abacaxi» ficou nas mãos dos negociadores e é provável que seja tomada uma decisão política favorável ao Rafale, sem que tenham sido tomadas as devidas precauções sobre que tecnologias terão e poderão ser transferidas, em que condições e com que direitos de fabricação e custos. Nada disso foi discutido entre Lula e Sarkozy.

A decisão política de Lula, colocou a força aérea numa situação meio estranha. Os militares têm obrigação de produzir um relatório técnico que possa ajudar o presidente a escolher, mas esse relatório não serve de nada se o presidente já tiver escolhido.

Sabendo que a opção de Lula não será a mais adequada aos interesses da FAB, os militares têm que fazer uma enorme ginástica para não entrar num conflito com implicações políticas. A FAB terá que aceitar sempre a opção do presidente, mesmo que a opção seja contrária aos interesses da força, e terá que gerir seus recursos em conformidade.

O problema principal, é que a FAB pode se ver no futuro com o problema de desenvolver toda a estrutura de suporte e apoio e mesmo de coordenar a produção de uma aeronave, sem que esteja escrito preto no branco que tecnologia pode ou não pode ser transferida.
A opção de Lula é tão «em cima do joelho» que qualquer presidente da França dentro de alguns anos pode dizer que nem sabe que promessas foram feitas.
«Transferimos tudo o que for preciso», é uma promessa muito vistosa, mas sem nenhum efeito prático.

Rafale: raízes de discórdia

A opção de Lula pelo Rafale é acima de tudo uma opção política.
O caça francês não é exatamente antiquado ou desadequado. Embora não tenha sido vendido a nenhum país, o Rafale é aparentemente uma aeronave sofisticada que já vai em sua terceira geração de desenvolvimento.

Além do problema de não se saber exatamente o que as indústrias privadas francesas querem disponibilizar (o governo da França não pode obrigar empresas privadas francesas a revelar seus segredos industriais) um problema gravíssimo coloca o Rafale numa posição desconfortável:
A alta da moeda europeia, o Euro, coloca o caça francês num altíssimo patamar de preço, ultrapassando de longe seus concorrentes.

O relatório da FAB, que já foi apontado como extremamente completo e tecnicamente irrepreensível, deverá apontar fatores favoráveis ao caça norte-americano F/A-18.
Mais barato que o Rafale; Acesso mais rápido e integração mais rápida com os sistemas AEW brasileiros; Acesso mais rápido a tecnologias e armamentos, que aumentam a capacidade da força num menos período de tempo.
A diferença de preço, poderia permitir ao Brasil a aquisição de mais meios, mais sistemas de apoio, mais armamentos ou armamentos mais sofisticados, que se poderiam traduzir em maior eficácia operacional.

Os norte-americanos também são normalmente muito mais precisos em suas afirmações sobre o que podem ceder, disponibilizar e autorizar e o que não podem.
A administração norte-americana fez já declarações que poderiam em princípio reduzir os receios brasileiros.
Além das declarações, há o precedente já estabelecido pelo Chile, que recebeu os sofisticados caças F-16C/D equipados com os mísseis ar-ar AIM-120.
Ao contrário do que era prática corrente do governo norte-americano, o Chile recebeu os mísseis em seu território. A força aérea chilena, é presentemente a mais poderosa de todo o continente sul-americano. Do outro lado da escala está a força sul-americana que mais caças de origem francesa possuiu: A força aérea e a marinha da Argentina.

A decisão porém, sendo política, estará já tomada pelo governo brasileiro. O comandante da Força Aérea, brig. Juniti Saito chegou a ameaçar com demissão, quando Lula afirmou que o vencedor seria o Rafale, mesmo sem saber o que a FAB aconselhava.

NOTA DO ÁREA MILITAR: Estamos seguros, de que tanto a Dassault quanto a Boeing, ou a SAAB, nos seus respectivos sites e notas de imprensa, terão toda a argumentação possível e imaginável para defender as suas respectivas propostas.

Já o areamilitar.net, é absolutamente isento, e evidentemente não tem qualquer interesse num ou noutro projecto, tanto no Brasil quanto em qualquer outro país. No caso brasileiro, qualquer das opções, se bem negociada terá vantagens para o país, e em última análise é isso que importa

No entanto, os factos apresentados são absolutamente indesmentíveis e nenhuma declaração de qualquer fabricante os pode colocar em causa.

Um governo, no caso o governo francês, não tem autoridade para mandar uma empresa privada ceder a uma empresa ou de um país estrangeiro (seja ele qual for) todos os segredos de um equipamento.
Afirmar o contrário, é contribuir para o que é costuma chamar de «conto do vigário».

Neste processo, todos os fabricantes têm «rabo preso». A própria Boeing, está condicionada pela possibilidade de o congresso dos Estados Unidos legislar contra a venda de material em circunstâncias especiais.

Restam os factos:
Nenhum fabricante afirmou que o Brasil poderia fabricar os radares, sejam PESA sejam AESA, ou os mísseis que poderão ser fornecidos.
A Dassault não pode afirmar que vai abrir toda a tecnologia dos sistemas de mísseis da MBDA!
A Boeing não pode dizer que vai ceder a tecnologia dos mísseis da Raytheon ou de sistemas de armas da General Dynamics.

Em nenhum lugar isso foi alguma vez afirmado, embora os entusiastas e torcedores, tenham levado a que se gerasse uma total e gigantesca confusão sobre o tema.

Sem TODAS as tecnologias envolvidas, um caça é apenas uma plataforma voadora e o Brasil não precisa de quem o ensine a fazer plataformas voadoras. Nesse aspecto, o Brasil está bem e recomenda-se e estaria provavelmente em condições de ensinar os outros.

A afirmação de cessão irrestrita de tecnologia, sem ser explicada nem documentada, nem alvo de acordos claros, constitui uma FRAUDE, e uma FRAUDE para a opinião pública comprar uma ou outra ideia.

Aqui, limitamo-nos a dar voz a quem pensa com a cabeça, e que nos envia os artigos, com informações e afirmações que são geralmente bem fundamentadas.
Em vez de pensar com o coração ou com o bolso, damos preferência a quem pensa com a cabeça.

O que importa, é o dinheiro que o contribuinte paga, e qual o melhor destino a dar ao dinheiro do contribuinte.

Essa é uma das funções a que o areamilitar.net se propôs desde o inicio.

Coisa que parece ter sido esquecida por alguns dos comentadores.

Os nossos cumprimentos
areamilitar.net

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