FX-2: A reaproximação dos americanos
Dois grandes negócios movimentam a área bélica aeronáutica internacional. O maior é a concorrência na Índia para a aquisição de 136 caças. Logo atrás vem o Projeto FX-2, a compra de 36 aeronaves para a FAB, operação de US$ 2 bilhões considerada prioritária para o Plano Nacional de Defesa. Três jatos estão na briga: o F/A 18E/F Super Hornet (Boeing), o Gripen NG (Saab) e o Rafale (Dassault). Porém, mais do que o debate técnico, a negociação envolve uma discussão doutrinária. Ainda que seja impossível adiantar o vencedor da licitação, o bastidor mostra como o mundo milionário do mercado de armas está sendo obrigado a se adaptar a novos tempos e a novos parceiros em potencial.
De um lado está o realismo adaptado ao cenário de conflitos assimétricos, no qual o caça, seus radares e mísseis são a plataforma de disuasão que continuará garantindo a paz sem conflitos entre Estados mas atuando contra ameaças transnacionais – tráfico, contrabando, pandemias e migrações – por exemplo. Do outro está a sedução do desenvolvimento comercial conjunto a partir de um mundo de parcerias tecnológicas e científicas. No caso, a aeronave funcionaria menos como armamento e mais como importante catalisador de inovações e negócios. Além da proteção, o país se credenciaria a um patamar de desenvolvimento econômico mais independente de controles externos.
Esse jogo será decidido até o dia 23 de outubro, Dia do Aviador, não na caserna, onde hoje se faz a avaliação técnica – cada caça será testado por uma equipe de pilotos – mas, acima, no âmbito civil do Ministério da Defesa. Em entrevista ao JB, o ministro Nelson Jobim é claro: o país não é comprador de nada, elegeu prioridades que o afastam da percepção de conflitos tradicionais e projeta a incorporação desse equipamento apenas se isso puder garantir o desenvolvimento científico em outras áreas – historicamente a indústria bélica sempre foi uma grande geradora de novas patentes.
Na disputa estratégica, dois oponentes se enfrentam diretamente tentando se encaixar nesse figurino: a Boeing e a Saab. Os americanos apostam mais na questão da recuperação do equilíbrio estratégico contra ameaças transnacionais: não só ampliaram a oferta de transferência de códigos-fonte (os softwares), como tratam o assunto na alta esfera de governo para uma reaproximação na cooperação militar, rompida desde acordo nuclear do Brasil com a Alemanha, nos anos 70.
– Lidamos com o desafio de superar 30 anos de desconfiança mútua – definiu o gerente do projeto do Super Hornet para o Brasil, Mike Coggins, apoiado por demonstrações claras de apoio governamental. Uma delas vinda do próprio departamento de Estado.
– O Brasil é importante parceiro global e essa é uma oportunidade de lidarmos com as diferenças – endossou o subsecretário de Estado para a América Latina, Tom Shannon, a jornalistas brasileiros na capital americana. Ao seu lado, o secretário-assistente Frank Ruggiero deu a medida do empenho da Casa Branca:
– Das duas mil licenças (códigos-fonte) que o Super Hornet carrega o departamento de Estado vetou a transferência de apenas sete para o Brasil – afirmou, recusando-se a revelar os vetos (“foram políticos, não técnicos”, informou apenas). Nos meios militares, no entanto, sabe-se que os americanos oferecem um míssil ar-ar de versão inferior à usada pelos EUA no Iraque e no Afeganistão. O Brasil não os quer.
Shannon afirma ainda que a compra do Super Hornet representaria um offset (troca de tecnologia) de 117 projetos apenas no âmbito da Embraer. Porém, parte da aposta reside em uma estratégia de aproximação contínua.
– Restabelecemos um grupo de trabalho conjunto depois de seis anos de interrupção – revelou o general David Fadok, diretor de política e estratégia do Comando Sul, citando a ida de oficiais brasileiro para missões recém-abertas no país.
FONTE: JB online