Jornal afirma que acionistas foram privilegiados e manutenção dos postos de trabalho foi colocada em segundo plano

Distribuir dividendos sempre é bem visto pelo mercado, mesmo em épocas de vacas magras. A visão dos investidores é de que a empresa precisa remunerar o acionista, que financia o negócio. Este tem sido o caso da Embraer, classificada pelos analistas como boa pagadora de dividendos. Mas para manter esta fama no mercado, a empresa decidiu optar por enxugar os custos, o que se traduziu na demissão de 4.300 pessoas.

Assim, apesar de todos os problemas operacionais, queda da demanda e demissões, a empresa deve continuar remunerando os seus investidores neste ano através do pagamento de juros sobre capital próprio e dividendos no mesmo ritmo dos anos anteriores. A remuneração dos acionistas da Embraer é bem maior do que o percentual determinado por lei. Em 2007, a empresa distribuiu 75,67% do lucro aos acionistas, enquanto o exigido por lei é 25%. Segundo as projeções da Merrill Lynch, a empresa deve pagar em todo o ano de 2008, um dividend yeld (dividendo pago por ação de uma empresa, dividido pelo preço da ação) equivalente a 7,5%. Em 2007, o indicador ficou em 8,3%. Para 2009, a projeção dos especialistas da instituição financeira é de 4,7% e de 6,1% em 2010. A média das 169 empresas que pagam dividend yeld acima de 5% é de 9,96%.

No ano de 2008, cerca de R$ 355 milhões foram distribuídos pela Embraer em juros sobre capital próprio e dividendos a seus acionistas. “Neste valor ainda é preciso acrescentar que mais recursos serão distribuídos no quarto trimestre e no dia 29 de março do ano passado, foi aprovado o pagamento de R$ 50 milhões em bônus para os executivos”, acrescenta Luiz Carlos Prates, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região.

A folha de pagamento total da Embraer soma cerca R$ 200 milhões ao ano. Assim, se os acionistas abrissem mão de parte do volume de dividendos e juros por capital próprio distribuídos anualmente pela companhia e reduzisse o bônus dos executivos de alto escalão teria recursos de sobra para pagar a folha de funcionários por um ano. “O que a Embraer quer é manter a margem, o lucro dos acionistas. Mas para isso está sacrificando seu maior patrimônio, o funcionário”, ressalta Prates. A demissão de 4,3 mil funcionários equivale a 20% da força de trabalho da empresa e abrange os segmentos operacionais, administrativos e gerenciais.

Ao contrário da Embraer, a General Electric (GE) decidiu preservar caixa em época de vacas magras. O Conselho de Administração aprovou a redução do dividendo trimestral da companhia de US$ 0,31 por ação para US$ 0,10 por ação a partir do segundo semestre de 2009. A decisão é inédita. A redução do dividendo a níveis competitivos é uma medida prudente para reforçar o balanço.

A lógica de remunerar menos os investidores e preservar os funcionários, entretanto, causa pouca sensibilidade no mercado. “O investidor compra o papel para participar dos ganhos da empresa. A busca é por lucros e dividendos. A lógica é que, se a empresa vai produzir menos, precisa de menos funcionários. O acionista é pouco sensível a estas questões sociais. Estar no vermelho é muito ruim”, diz um analista de corretora.

O consultor da Fipecafi (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras), Luiz Jurandir Simões, explica que, em economia, não é possível balancear interesses tão divergentes. “Há o paradoxo cruel entre demissão de funcionários e remuneração de acionistas. Apesar de ser criticada, esta decisão da empresa tem como objetivo preservar os resultados”, afirma. Sem querer entrar no mérito sobre o que seria mais justo, o consultor mostra que, se a Embraer optasse por manter os funcionários ociosos, arcaria com custos maiores, o que implica em redução da margem e, por consequência fuga de investidores e, quem sabe futuramente, um volume de demissões bem maior.

Na avaliação do diretor da Solidus Corretora, Emerson Lambrecht, o grande problema enfrentado pela Embraer no momento é a questão da imagem. A decisão de demitir os mais de 4 mil funcionários foi tão mal vista pelo mercado ou até mais mal vista do que se a empresa tivesse anunciado a redução do percentual de dividendos distribuídos. “Se a companhia decidir reduzir o dividendo agora sofrerá mais um impacto de imagem. As decisões deveriam ser tomadas de forma gradativa. Se a empresa tivesse reduzido o dividendo previsto e ingressado em um processo de corte de custos e demissões, não teria tido um problema tão grande de imagem“, ressalta.

Piores resultados

A Embraer tem sentido a queda da demanda e a expectativa é que o cenário negativo marque o ano de 2009. Ao mesmo tempo que projetam resultados piores, os analistas têm reduzido a recomendação para o papel. Em três meses, a Embraer reduziu duas vezes as projeções de venda dos jatos. Em novembro do ano passado, a empresa revisou sua orientação ao mercado de vender entre 315e 350 jatos para 270 jatos (18%). No mês de fevereiro nova redução foi feita: para 242 jatos. O motivo para a diminuição provém da aviação executiva, seguida pela aviação comercial. Para a família Phenom o panorama mantém-se inalterada em 110 jatos. A redução é um resultado do adiamento das compras, não cancelamento.

A Embraer também informou ao mercado que estima para esse ano uma receita de US$ 5,5 bilhões, 12,7% a menos que a projeção anterior, de US$ 6,3 bilhões. De acordo com relatório divulgado pela Corretora Ágora, não estão descartadas novas reduções nos próximos meses. A corretora reduziu sua recomendação para as ações da companhia de “compra para o longo prazo” para “manter”. O preço alvo se encontra em revisão.

A previsão dos analistas da Lopes Filho é de que a Embraer tenha encerrado o ano de 2008 com um prejuízo de R$ 455,9 milhões e as perdas se agravem em 2009. O prejuízo previsto é de R$ 617,6 milhões. Os resultados do quarto trimestre da companhia ainda não foram divulgados, mas segundo o que Embraer já anunciou, foram entregues 59 aviões, queda em relação às 61 aeronaves do mesmo período de 2007. Apesar disso, a companhia bateu recorde no ano passado, com 204 jatos despachados a clientes. O valor dos pedidos firmes em carteira era de US$ 20,9 bilhões, também recorde frente aos US$ 18,8 bilhões no mesmo período de 2007.

FONTE: Monitor Mercantil

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